O PAPEL
Meus olhos são como meu coração expressa logo tudo da minha alma.
Encontrei alegria e conforto em escrever assim, publicamente.
Que absurdo!
Sempre escrevi de maneira escondida entre receitas e em agendas de cada ano.
Bem escondidinho, para ninguém saber.
Eu mesma queria ignorar toda a beleza interior ou sofrimentos que me invadissem.
Cada agenda anual começava vazia, sem ter o que dizer.
E depois estufava de cada espacinho aproveitado para registrar reflexões, insights.
É por isso que amo o papel e a caneta, companheiros de toda a vida.
Guardavam minhas confidências.
Minhas transformações. Meus crescimentos.
A descoberta da vida.
Do sim e do não.
Do talvez. Da esperança. Dos planejamentos, tais, que confundia com sonhos.
O papel é físico, real, escuta a palavra que dita percepções e emoções sem precedentes.
É um amigo, um companheiro confidente, cúmplice, íntimo
que encontrei na vida. Assim achava e assim vivia.
E quando as agendas foram insuficientes para tudo guardar
Comecei a extravasar no desenho no papel.
O papel passou a ser amplo em dimensão e de amplitude de gramatura
Para soltar traços, emoções, em tonalidades negras e brancas.
Desenhei muito. Lembrei em qualquer acaso, que expressava melhor
Em traços e linhas tudo que vinha a alma.
Durante anos desenhei com o carvão, “fusain’, lápis B, 6B, conté, e outros de efeitos mais diversos que fui conhecendo ajudando a expressão.
Íamos aos fundos do jornal O Globo, no Rio, que o jornal nos dava as enormes bobinas de papel que sobrava, com muito papel ainda, uma riqueza para nós os desenhistas da EBA, para soltar a mão, a imaginação e a emoção a todo o tempo que a alma pedia.
Aqueles grandes papéis eram uma libertação.
Libertação é a porta da liberdade.
Vivia atravessando esta porta.
E desde então, acho que a mantive aberta
E a evolução se processava livre.
Agora que escrevo um livro, veio o sonho de registrar em livro esses desenhos.
Um livro ilustrado.
Sem palavras.