DA JANELA DA EMMRIAÓ
Da janela da memória
Da janela da memória Vejo o “velho Brígido” caminhando descalço, caças passos lentos, pelas ruas da cidade com um pedaço de pau nas mãos, servindo de cajado, paletó surrado, calças dobradas aparecendo às canelas, barba e cabelos longos a serem cortados. Quando chega à frente do cinema do “seu Bentinho” senta-se para descansar. Logo passa o seu Alcí de Souza, me oferecendo um bilhete de loteria federal ou uma fezinha no jogo de bicho. Jogo no Galo, mas deu o Burro. Seu “Valinho” passa dirigindo a rural azul e branca da prefeitura caindo em pedaços, e tira um fino da “Caloi barra forte” do Zé do Donga, que estava estacionada no meio fio da calçada do “Restaurante Garcia”, enquanto ele se encontrava dentro do estabelecimento trajando um impecável “safári” azul piscina, com um sapato preto que dava de se espelhar de tão bem engraxado pelo seu filho Agnaldo, saboreando uma cerveja estupidamente gelada.
Vejo o “Calinho da Beata” entrando e pedindo para o seu Joaquim uma cachacinha e dialogando com o Vosca todo nos “esses”. A pauta da prosa era a vitória de 2 X 1 do Palmeiras Futebol Clube em cima do Marcílio Dias, com os gols do “Dica” e do Rogério Garcia, que contaram também com a ajuda do goleiro “Cará” que agarrou um pênalti depois que entrou durante a partida substituindo o “ Fibe”.
Era 6 de setembro dos anos 70. No outro dia pela manhã, iria ser comemorado mais um aniversário da independência do Brasil. O “pentelhinho” do André Pereira, com apenas 8 anos de idade, iria tocar na fanfarra. Os alunos das escolas isoladas viriam desfilar, pois o Ilmo Sr prefeito Amadio Dalago tinha alugado o ônibus ”Cabeção” do Camarão para transportá-los. A alvorada começaria quando a Malva tocasse o sino da Igreja matriz às 6:00 horas da manhã.
O “Zé do Jica” me falou que o seu Nahor que tinha deficiência auditiva, escutou o mudo falar que o “Antônio cego” iria assistir a uma partida de futebol depois do desfile. O time estava escalado com Kido Vechi no gol, Pepa e Teté Duarte na defesa, Kau e “Jonas da muleta”, meio campo, Bitu e Amaro da Dodoca como alas, “Aristo, o” Tatú”, o “Bilau”, Zé Domingo e Ziquinho e Dé no ataque.
Estava começando a esquentar o tempo e mandei o Adriano comprar um picolé de groselha no bar do seu “Bento Gordo” mas ele me trouxe um de coco, do Marcílio, mais tarde bateu a fome, e ele foi comprar duas fatias de “Torta de banana” da Dona Luci..
Minha avó Zizi estava de cama, desejou comer os biscoitos da padaria do seu Lídio e pediu para a sua filha Maria Helena ir comprar, mas ela estava chateada por não terem deixado ela ir dançar na boate do Áureo, e mandou o Quincão; que as pressas montou em sua bicicleta e foi buscar.
De repente me deu vontade de brincar no parquinho que existia nos fundos da prefeitura velha, mas já não existia mais. Uma quadra esportiva tinha sido construída em seu local, e o Dico do Lorival tinha caído, e na queda teve um traumatismo craniano.
Vi minha infância na janela do tempo, e de repente eu estava pedalando meus triciclos pelas calçadas da praça da matriz, nas festas do Divino. Escutando o tio João Garcia tocar instrumento de sopro na “Banda Os Foliões”, jogando no aviãozinho. O Adriano era pajé do cortejo imperial e se enchia de calos nos pés, por não estar acostumado a calçar sapatos.
Fecho as cortinas para voltar ao presente, percebo que o tempo passou e a história está guardada em minha memória, e me pergunto: não seria hora de resgatar?