(Frase Martha Medeiros)

A Minha Décima e Derradeira Crônica

        Com o dissabor das intermináveis conversas de motoristas de táxi, eis aqui minha décima e derradeira crônica.

        Os motoristas de táxi são uns psicólogos por excelência, sempre têm uma resposta para sua indagação, e vão mais além, são capazes de passarem vários minutos aconselhando os passageiros com suas experiências pessoais de vida, se não és um ser de muita conversa, existe uma técnica infalível para escapar desses tortuosos minutos de conversação até o seu destino, faça cara de poucas conversas, se possível nem dê um bom dia, ou boa tarde ou boa noite, diga o seu itinerário e faça uma cara de que estás muito preocupado com alguma coisa, ou faça cara de mal mesmo, eles ainda vão tentar uma aproximação, --- o Sr. viu como o trânsito aqui ficou mais lento?, ou --- esses motoristas não sabem nem dar a seta!, ainda, --- já estão montando o palco para um show que vai acontecer por aqui!, cilada, é armadilha, não dê um pio, sob o risco de passares a saber a marca da pomada que a sogra do mesmo está usando para curar hemorróidas e o nome do vizinho do mesmo que gosta de criar passarinhos.
        A cara de mal é mais infalível do que simulares que estás preocupado com alguma coisa, dissimular preocupação é um prato cheio para alguns que vão querer saber o que o aflige a todo custo, cara de mal não, eles ficam desconfiados e até temerosos em trocar com você meia dúzia de palavras.
        Certa vez, dia dos pais, eu e meu genitor pegamos um táxi para nos locomovermos ao nosso destino, o teor da conversa era o modo de vida daqueles seres brutos do interior, daqueles que se mirarem no olho e acertarem na pestana afirmam que erraram o tiro, percebi no desenrolar da conversa, o taxista ao perceber que meu genitor provinha dessas árvores genealógicas brutas do interior, que tudo era motivo de gargalhada misturada com um tênue ar tenso de se ter um ser bruto desses ao seu lado, taxista franzino, de idade bem avançada, quase que não acerta o destino final, ao chegarmos finalmente, meu genitor lhe entrega algumas cédulas, e saí do veículo, o taxista ajeita seus pequenos óculos de grau, conta a quantia e faz um ar de que precisava dizer algo, porém, os seus lábios não os deixavam externar, eu mais atento percebi que equivocadamente meu pai tinha pago uma quantia menor do que realmente devia, nisso eu exclamei:

        --- O valor foi bem mais além do que isto que lhe fora pago, me aguarde que vou pegar o restante com ele para assim completar o total devido, mas, por que o Sr. não exclamou que ele tinha lhe dado um valor errado?

        Aquele Sr. de idade avançada e possivelmente com uma larga experiência de vida, aflito exclamou:

        --- Mas o Sr. acha que eu sou doido de falar uma coisa dessas para ele? Eu estou muito satisfeito com o valor recebido, e se ele me entender mal? Vai que ele tem uma peixeira escondida por entre as calças, eu sou lá doido!

        Vida de taxista tem, e muito, dessas coisas...






 
O Poeta do Deserto (Felipe Padilha de Freitas)
Enviado por O Poeta do Deserto (Felipe Padilha de Freitas) em 04/02/2010
Reeditado em 23/10/2015
Código do texto: T2069519
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