"What's this a picture of?" (30/03/08)
Continuo olhando a foto. Sentado, tentando dar forma a um texto qualquer enquanto a chuva clichê continua a cair anarquicamente pela madrugada de sempre, prossigo analisando, fazendo uma nota mental de todos os detalhes da gravura, os pequenos pontos tão importantes e necessários na criação de um motivo que vai guiar o meu pensamento quando, no futuro, for tentar descobrir o que me fez passar tanto tempo parado e extasiado. T-e-r-r-a-d-a-m-a-g-ia. Encontraria a Maga? Óbvio que não, Cortázar. Eu não. A coloração artificialmente azulada me dá mais certeza disso; a sensação de perseguir um espectro, de fitar um fantasma que insiste em olhar para outro lado, onde a luz começa a estourar, já depois das plantinhas que não sei se estão penduradas ou dispostas. Punctum. Não adianta correr pela cidade da lembrança, nem esboçar a Paris/Buenos Aires/Londres imaginária, ou seja lá que lugar for, pois percebo – e continuo olhando a foto – que não importam os prêmios, as ficções e os detetives selvagens, já que, no final de tudo, tenho mais saudade do sonho do que da personagem que lá habita(va). “Sonhei que você sonhava comigo”, mas o que fazer com esse tipo de situação senão lamentar, da mesma forma que sigo lamentando não ter disparado o obturador, não ter a proximidade de poder, não ter tempo hábil para, no mundo real, fazer um comentário silencioso sobre o cabelo, cuja cor de saudade (De quê? De quem? Por quê?) foi tão bem definida por alguém que nunca o viu, mas me entendeu. Enquanto isso, a música vai embalando o momento, na justa hora em que penso – sem abandonar o olhar, obviamente – em alguns versos aleatórios do Thomas, que deixaram de ficar perdidos no vácuo da ocasião e agora infelizmente fazem parte de uma época; atrelados a uma situação vulgarmente pictórica e subjetiva, ridícula até. No tell-tale lover has an end more certain/All legends' sweethearts on a tree of stories/My cross of tales behind the fabulous curtain. Velhos tempos em que não entendia esse tipo de coisa e, perdido nas ruas do pensamento, matutava sobre a veracidade de certos problemas utilizados por alguns para questionar um simples “Olá, tudo bom?”, ou um inofensivo “como vai?”. Mas é verdade, e por mais que se tente apelar para o subjetivo, o final é sempre o mesmo. No tell-tale lover has an end more certain. Estou olhando para todo um passado seletivo, que insiste em sempre ser presente, uma perseguição implacável empreendida, veja só, pelo meu olhar imbecilizante que não admite a menor desfiguração simbológica; tudo é mais que o normal, mesmo sendo apenas simples, besta, risível. Punctum. Puxa a retina, dói na vista, na alma, no pensamento, na conclusão, nas conclusões que vieram antes, atropela tudo, até mesmo o que ficou incompleto. No fim, é sempre igual, só muda o texto, o grande escrito do passadopresentefuturo que engloba todas as cópias de nomes e cidades diferentes, de fotos diferentes, com posições levemente modificadas. Não sei, definitivamente, mas continuo olhando. Estariam os braços cruzados?