COM "PENA" DO URUBU

Série: Crônicas da Natureza

*ghiaroni rios

A limpeza da praia em Mucuri deixa a desejar. Assim, o serviço discreto dos urubus, recolhendo resíduos sólidos mal cheirosos, é bem vindo. Ocasionalmente, até mesmo um peixe que por algum acidente de percurso vem morrer na praia, é aproveitado pelos carniceiros. Bem diferente do serviço de limpeza de praia em Ipanema. Era o 11º Encontro Nacional de Comitês de Bacia Hidrográfica, em novembro de 2008. Quase dois mil técnicos, políticos e bem intencionados ambientalistas de todos matizes, discutindo a política nacional de proteção das águas. E o moderno trator limpando Ipanema. Recolhe areia e detritos e devolve à praia apenas a areia limpa.

Mas em Mucuri, no extremo sul da Bahia, não é somente lixo que incomoda. A implantação do sistema de coleta e tratamento de esgoto doméstico está com obras paradas. O mar invade a orla destruindo bares, barracas e casas, antecipando o efeito estufa. Mas vou à direção dos idosos que afirmam que a cidade foi construída empurrando o mar que agora exige o troco, seu espaço. Mas Mucuri tem seus encantos. Um mangue razoavelmente preservado, com uma grande passarela de madeira em seu interior, que permite ao visitante conhecer a vida pululante do mangue sem atolar na sua sadia lama.

E nesse encontro no Rio, dos Comitês de Bacia Hidrográfica (CBH’s), com bom apoio estrutural da dona ANA (Agência Nacional de Águas), presença do combativo Minc, para surpresa, uma linda carioca, estudante de sociologia e fissurada em meio ambiente, relatou grave denúncia: que nosso orgulho nacional, a Petrobrás estava projetando/implantando(!?) uma imensa refinaria, impactando uma das últimas unidades de mangue preservados do estado do Rio. Como Presidente Lula não tem que haver CPI da Petrobrás? Seu partido, antes de chegar ao poder central não era campeão de propositura de CPI’s? A grande estatal é acima de qualquer suspeita? A implantação da refinaria estaria sendo mantida em segredo, a sete chaves!.

Está surgindo a verdade ambiental relativa, No sul da Bahia, a Suzano Papel e Celulose proclama que desenvolveu espécie de eucalipto cuja raiz aprofunda somente 2,5 metros, não sugando toda água do solo, e que ainda gera créditos de carbono. Por raciocínio, então o polêmico eucalipto alterava o lençol freático esgotando e empobrecendo o solo?

É triste fato que o Tratado de Kioto ainda comete esta falha, remunerando florestas homogêneas plantadas, como o eucalipto, que consome, seqüestra carbono da atmosfera, mas não reembolsa um tostão por manter florestas nativas preservadas, como remanescentes de Mata Atlântica sobreviventes no sul da Bahia. Deverá (o tratado de Kioto) ser revisto em 2012.

Ah, e o Urubu que me despertou pena em meio a outros de sua espécie, planava a pequena altura movido pela brisa da praia, portava incômodo estandarte. Em seu pé esquerdo, bem enganchado (deve ter tentado muito arranca-lo com seu forte bico) havia um plástico branco encardido, de sacola talvez, com uns 40 centímetros, que esticado pelo vento fazia o efeito de uma biruta de aeroporto, indicando a direção do vento. Coitado. Vai sentir na pele qual o tempo de degradação de um plástico, até ter seu pé inteiramente livre daquele símbolo de poluição.

Mas obrigado Urubu, por ter motivado este preguiçoso escritor a iniciar esta série Crônicas da Natureza.

*o autor é ambientalista/escritor

ghiaroni rios
Enviado por ghiaroni rios em 02/02/2010
Reeditado em 24/03/2011
Código do texto: T2065305
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.