Parar ou Continuar

Muito modernamente a psicologia vem apresentando um conceito muito novo chamado de resiliência. Parece que é um tema tirado da física. É que certas pessoas parecem possuir uma tal força interna que resistem a qualquer adversidade da vida. Daí a mídia, apressadamente,começar a fazer a propaganda do brasileiro como sendo resiliente, aquele que resiste a tudo, que não desiste nunca. Até que Euclides da Cunha, nos Sertões,teve um vislumbre dessa tal de resiliência, quando cunhou a frase, mas só para os nordestinos, “o nordestino é antes de tudo um forte”.

Mas como vivemos num mundo dual, de opostos, às vezes é bom resistir, noutras é melhor parar, como bem acentuou o nosso admirável escritor Veríssimo, em recente crônica. Falava ele sobre a necessidade de parar, contrariando, assim, o conceito da resistência. Dava o exemplo do escritor que está escrevendo um alentado romance e que, de repente, sem mais nem menos, pára de escrever e envia correndo seu manuscrito para o editor no estado em que se encontra a obra, para não correr o risco de nunca conseguir terminar o seu romance. Outro exemplo marcante, lembra ainda o nosso escritor, foi o do recém-falecido Michael Jackson, que não soube parar de fazer plásticas em seu rosto, de modo que a cara do assim chamado rei do “pop” se transformou em algo insólito(não resisto e não paro de aplicar esta palavra,pois foi a primeira palavra mais estranha que conheci na minha adolescência), difícil de dizer afinal com que cara o artista ficou, se é que restou ainda alguma cara!

Esta crônica do Veríssimo abordando tema tão transcendental para o ser humano, semelhante ao famoso ser ou não ser de Shakespeare, me faz não resistir e apresentar minha paródia- parar ou continuar-, eis a questão!

Lembrei-me que muitas das vezes pedimos para continuar, como no exemplo histórico do filósofo inglês Francis Bacon, o primeiro a conceber um método para a ciência, tendo sido o maior orador de seu tempo. Ben Jonson dizia “que nenhum homem falou com maior clareza, resumida e seriamente que ele, tanto que os ouvintes não podiam tossir ou sequer desviar o olhar, sem perderem alguma coisa. Dominava as emoções da platéia e o receio de todo o homem que o ouvia era justamente de que ele parasse de falar”. Mas esse exemplo que cito, para falar a verdade, é a famosa exceção que confirma a regra. É possível talvez citar mais outra exceção, que foi a persistência e o perfeccionismo de Vatel, famoso cozinheiro francês, que viveu nos tempos de Luiz XIV, o rei-sol, que acabou por inventar, com sua resiliência,sem jamais parar com suas experiências culinárias, o apreciado creme de Chantilly.

Mas fora esses dois escassos exemplos, concordo que precisamos mesmo de parar com muita coisa e o mais importante passo seria, segundo o próprio Bacon, parar de mentir, o que iria provocar, na minha modesta opinião, uma tal mudança no mundo, que, talvez, ficasse irreconhecível a vida e, sinceramente, não sei aonde iríamos parar...

Admitamos, pois, que chega a hora em que temos de parar de fumar, parar de torcer para o Vasco(que não é o meu caso,felizmente,pois sou flamengo), parar de beber, parar com aquele namoro encruado e outras coisas que tais.

Tenho até que reconhecer que preciso parar de buscar mais idéias sobre esse assunto, pois acaba de se insinuar em mim um pensamento sinistro: - será que tenho de parar de fazer crônicas ?