AINDA SOBRE O HAITI
Não há palavras que digam do horror, nem as imagens chegam a dizer plenamente do horror. Quanto a descrições sobre o horror, uma das mais terríveis que ouvi foi pela boca de um repórter ( creio que da Globo) em que ele dizia de, em certo momento, observar mulheres a pegar barro do chão e depois misturar a esse barro colhido, manteiga e sal e irem enrolando e pondo os “objetos” resultantes para secar. O repórter imaginou ser algum trabalho artesanal da tradição haitiana,fabricação de objetos para serem vendidos a turistas; pouco depois viu que as mulheres davam esses objetos feitos de barro para as crianças e as crianças os comiam: eram biscoitos feitos de barro, o único “alimento” possível. Afinal ( perdoem o horror herético talvez do que vou escrever, perdoem, levem esta ironia sarcástica à conta de uma inenarrável amargura):"Do barro viemos, ao barro voltaremos”. O repórter que narra tais cenas,voltou mais tarde com leite e chocolate para as crianças, que vinham às dezenas, talvez às centenas. E as que comeram do chocolate e beberam do leite vomitaram, não suportaram ingerir alimento de verdade.
É o retrato do dantesco, que Dante não imaginaria. E, mais terrível que tudo: Não será o RETRATO INVISÍVEL DO DANTESCO COTIDIANO EM MUITAS OUTRAS REGIÕES DE ABSOLUTA MISÉRIA NO MUNDO, TAMBÉM? Pobre, miserável povo do Haiti, vivendo o apocalipse de seu país. Pobres povos da África, de regiões ignotas da Àsia, de - certamente - regiões ignotas do Brasil. Onde será a próxima manifestação destes tempos de apocalipse, apocalipse gerado pelas mãos e desmandos criminosos, genocidas, dos donos do Poder, através da História desta nossa miseranda espécie?
Zuleika dos Reis, na manhã de 18 de janeiro de 2010.