"Com governo ninguém pode"
Ruben Siqueira é um jornalista baiano que se bate contra o projeto de transposição do rio São Francisco, porta-voz da Frente Cearense Por Uma Nova Cultura de Água e Contra a Transposição, da Frente Paraibana em Defesa da Água, da Terra e do Povo do Nordeste, da Articulação Popular São Francisco Vivo, da CPT – Comissão Pastoral da Terra e da Diakonia no Rio Grande do Norte. Escreveu longo artigo na Folha de São Paulo descrevendo os martírios das populações do campo na região de Quixabinha, município de Mauriti, no Ceará. São 83 as famílias já removidas ou a serem removidas de suas casas e roças. As obras são da transposição de águas do Rio São Francisco para o chamado Nordeste Setentrional, que abrange os estados do Ceará, Paraíba, Rio Grande do Norte e Pernambuco.
Na matéria, ele introduz os elementos críticos “sonegados pela propaganda oficial sobre a obra”. Sem entrar no mérito da questão, pra lá de polêmica, registro meu contentamento em ver uma estrofe do meu cordel “Biu de Pacatuba, um herói do nosso tempo” citado no intróito da matéria: “O sistema só tolera / Dois tipos de componentes:/ Os tiranos que exploram/
E os subservientes. / Os que lutam por justiça / Serão sempre dissidentes.”
(Fábio Mozart, Biu de Pacatuba - Um herói do nosso tempo ).
No folheto, ainda inédito em formato impresso, narro a saga de Biu de Pacatuba, apelido de Severino Alves Barbosa, um dos principais líderes das Ligas Camponesas na Paraíba. O cordel citado pode ser lido em http://www.fabiomozart.com/biu_pacatuba_26.html.
Sob o signo da internet, essa tradicional literatura popular nordestina encontra caminhos inusitados e reveladores. Mesmo sem ter sido impresso, meu folheto ganha o mundo, dando notícias de nossa vocação libertária, como preâmbulo de manifesto de luta das classes subalternas na guerra incessante para “"não se deixar cooptar, não se deixar esmagar, lutar sempre, conquistar na luta vitórias reais com o povo", conforme declarou com firmeza ideológica o pensador Florestan Fernandes.
“Com governo ninguém pode”, termina o jornalista sua reflexão sobre a política de Lula em relação aos problemas da terra, citando essa expressão “de antigas e angustiantes reminiscências e tantas vezes ouvida da boca de indefesas vítimas da transposição”. Para ele, soa como “escandaloso fracasso da nossa incipiente e débil democracia e um permanente desafio às consciências livres e à recriação permanente da luta social”.
Parafraseando, diria que com a cultura popular não tem quem possa, que ela vai se adaptando aos novos tempos, atraindo cada vez mais a atenção do público pelo mundo afora, atenuando a linha que divide a cultura dita popular e os meios de comunicação eletrônica, revelando raízes imprevistas entre as duas mídias, folheto e internet. O cordel vem mudando paulatinamente a sua forma de difusão, adaptando-se aos meios modernos, sumarizando a vocação multimídia do poeta popular.