SAMBINHA DE UMA CORDA SÓ
SAMBINHA DE UMA CORDA SÓ
(Da corda mi ao jazz)
E tudo começou como brincadeira. O feitiço virou-se contra o “feiticeiro” – feitiço virtuoso, sonhado, desejado.
Eis o cenário: o pai, seus dois filhos, um sofá e os violões. Tudo regado por apostas ( de brincadeira ) nunca pagas, mesmo porque dinheiro nenhum compraria aqueles momentos de ternura, preciosos momentos onde filhos e pai são conduzidos pela luz do Espírito Santo.
Nesse encontro não há choques, nem conflitos de gerações. Se houver são “perfeitamente elásticos”. Estão mantidos ali , não só o elo sanguíneo, mas criador e criatura tornam-se um só – tudo é harmônico.
Os sons se confundem e, o dedinho que, sozinho dedilhava “Carinhoso” ferindo apenas uma corda, agora se une aos outros e, juntos, passeiam pelo corpo do violão, revelando sinais inequívocos do gosto pela música.
Com o tempo diz-se adeus a ingenuidade para explicitar a ousadia.
Enquanto o pai procura entrar com a maturidade, o conhecimento limitado, mas valioso e, porque não, com a paciência, o filho vem com o descompromisso, engravidado pela ousadia e, tudo se faz, agora, por puro prazer, por pura alegria - companheira sempre presente nessas viagens pelo pop, pelo samba, pela bossa, pelo chorinho e, é claro, pelo jazz.
E o jazz vem, agora, embalado por doses similares de sofisticação e de intuição, pronto para acariciar ouvidos treinados ou para despertar aquelas almas, cuja relação com a música ainda estão distantes.
Agora é o filho levando o pai a investigar o pop, o jazz, a bossa, resultado da herança não só genética, mas lapidada dia a dia , respirando os mesmos ritmos, alimentados pelo mesmo comburente, resultando uma explosiva combustão que, além do calor humano que produz, encerra também intenções, virtudes, abusando de harmonias pré-estabelecidas para criar um tráfego incessante de acordes, numa relação musical em que ouvintes atentos sempre saem ganhando.
É, perdi o nenezinho de colo – que ficou apenas nas fotografias e, é claro, nas minhas lembranças, mas ganhei
o homem, o filho que agora também aprende a se doar.
Desta feita, sinto-me, de novo, uma criança. Sinto-me eterno...
Se, em muitos instantes , me entristece o vazio provocado por alguns dias distantes desse filho adorado, logo me alegro, pois nele moram recordações deliciosas e a certeza de que o amor que nos une jamais será corroído e, tampouco, esmagado pelas engrenagens do tempo. (06/08/03)
Carlos Roberto Furlan
Eng. Agrônomo/Professor