Mantendo o combinado.
Maria Clara anda preocupada com a mãe. Nos últimos dias ela anda um pouco...estranha; não, estranha não mas...diferente, é isso, muitíssimo diferente.
A menina fica pensando sobre isso e vai listando mentalmente: roupas, cabelo, brincos (a mãe não sai sem eles), colares (os mais incomuns, de preferência) e constata que nisso continua tudo igual. A mãe gosta de jeans, camisetas, batas e bolsas sempre enormes, onde guarda tudo que não sabe onde colocar no momento. Não, definitivamente a mudança não é por aí. Acha que é no jeito, no olhar da mãe, especialmente quando olha para...ela!!!?
É isso mesmo. Como aconteceu naquele dia em que chegou da escola e foi contar a super novidade (já não lembra qual) e a mãe acompanhou a história, mas parecia querer falar alguma coisa e acabou esquecendo o que era.
Flagrou o mesmo olhar no rosto da mãe quando, no domingo, estava conversando com o povo no Twitter, Orkut, MSN e mostrou para a mãe como a mão dela ficava mais clara e as unhas pareciam mais longas com aquele esmalte vermelho “Rubi”. Tirou a mão direita do teclado, ergueu-a e perguntou à mãe:
- E aí, gosta? Fiquei muito branca, né? Aliás, como é que alguém pode ser tão branca, mãe? Bom, apesar de que você é bem branquinha e tem mais pintinhas e meu pai não é nenhum morenaço...ô mãe, fala alguma coisa. Gostou?
- É...bom...a cor é bonita sim, mas você sempre gostou de cores claras...quero dizer, você sempre usava esmaltes quase sem cor, a não ser quando resolvia brincar com suas amiguinhas.
A menina, com os olhos arregalados, agora bem mais branca, manda:
- Mãe do céu!!! Brincar com minhas amiguinhas!!? Jura, promete, que nunca vai repetir isso quando elas estiverem por perto!
- Maria Clara, não comece um drama agora! Está bem, nem brincar nem amiguinhas. Mas não vejo onde está o absurdo disso, afinal até bem pouco tempo vocês adoravam brincar com as minhas coisas.
- Ai, manhêe!!! – a menina já estava em franco desespero.
- Ok, certo – retruca a mãe em tom conciliador.
- Mas tem uma coisa Maria Clara – assim mesmo, os dois nomes bem pronunciados.
- Aquilo que combinamos continua valendo, certo?
A menina lembra, revirando os olhos, mas com um sorriso querendo já aparecer, que “aquilo” significava que não era para beijar, ficar ou qualquer coisa do gênero e tomar cuidado com garotos.
Agora, já soltando sonoras gargalhadas, lembra o resto do combinado: mas se beijar ou ficar contar para sua mãe imediatamente!
- Ai, mãe, só você mesmo – disse a garota, já chorando de tanto rir.
- Não vejo motivo pra tanto espanto – agora a mãe já meio que sorria também.
- Mãe, você, primeiro, diz que não é para eu beijar nenhum garoto; em seguida você diz que, se por acaso, eu beijar, é pra contar de cara pra você. Dá pra crer? – a gargalhada aumentava e a mãe estava segurando a sua.
- Claro que dá Maria Clara. Eu não quero que isso aconteça já, mas se acontecer quero saber, ora!
- Manhê...você sabe que não tem nenhum garoto que eu queira ficar.
A mãe ia saindo do quarto, com um sorriso nos lábios quando ouve:
- Mãe do céu!!! Eu sabia que tinha uma coisa pra contar e com essa conversa toda estava esquecendo.
A mãe se volta, ainda na porta do quarto.
- Lembra do Betinho? Aquele garoto por quem eu era a-pai-xo-na-da na terceira série? Mãe do céu, ele tá gatíssimo e pediu meu MSN e o número do meu celular pra Lu! Tem mais: ele falou que vai na festa da Crica só pra me ver! É muito “per” – de perfeito – mãe!
Novamente a menina percebe aquela coisa diferente na mãe, mas passa rápido. Ainda parada com a mão na maçaneta da porta a mãe pergunta:
- Hã..filha...Maria Clara, você não acabou de dizer que não tem nenhum garoto que você queira ficar?
- Disse, ué...bom..hã...
- Quer saber – diz a mãe com um suspiro – por enquanto, abafa o caso!
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