Feijoada

Romilda passa por um sério problema de saúde. Sua irmã e uma amiga partem do interior paulista para a capital, afim, de ampará-la nesta hora tão critica. O tratamento vai ser longo e a ajuda afetiva pode acelerar a cura.

Como as duas não dirigem contratam um motorista. Julius foi recomendado por uma amiga. O homem excede todos os limites de segurança propostos pela legislação de transito. Passa sinal vermelho, não dá atenção as lombadas, entra na contramão, e na estrada cria asas. As amigas chegam ao apartamento de Romilda, trêmulas, ainda assustadas pelas loucuras do motorista.

O ambiente familiar não é dos melhores. A tristeza e o medo invadem Romilda. Fica meio que anestesiada pela realidade. Não pode acreditar no que vai passar. Toda cooperação dos parentes mais próximos é o caminho para a cura. Mas, o marido da Romilda não tem pra ninguém! Ditador, egocêntrico extremado, mal humorado, sovina..., enfim, os mais velhos o rotulam, sem pestanejar: “Ele é uma carne de pescoço”.

As amigas o apelidam de Mussolini. Na cozinha elas são imbatíveis. Preparam pratos saborosos para animar à doente. Manhã de domingo, “El Ditador” entra na cozinha e ordena: “Quero comer feijoada.”

A partir deste dia as amigas passam por brincadeira a chamar uma à outra de Benedita e Expedita. A ordem da feijoada rendeu a manhã no supermercado e depois na cozinha. O mais singular na história é que Mussolini tira do bolso vinte reais, dá para a cunhada a fim de comprar os apetrechos. “Olha devolve o troco”.

As duas saem criticando a avareza do homem;

“Será que ele pensa que o caixão dele vai ter gaveta!”

“Nossa! Tio Patinha perde para esse mão de vaca!”

Carrinho no corredor do supermercado carregado com: alho, cebolas, couve, carne seca, costelas de lombo de suíno, feijão preto, lingüiças, pés de suínos, paios, rabos de suíno, toucinho defumado. A compra fica em sessenta reais. Expedita é que paga o resto da conta.

Mãos a obra, ou melhor, aventais na cintura foi um tal de limpar, aferventar para tirar o excesso de sal e de gordura. “Romilda vai comer uma feijoada ligth. Nada de exagero, pois ela fez quimioterapia, quinta-feira!”

Meio dia!

“Como é essa feijoada vai demorar! Ah! Faz uma caipirinha para mim”

Mussolini escancara a boca na cozinha, o seu corpanzil atrapalha os movimentos de Benedita e Expedita.

“Eh! Só falta essa ! Me esqueci do limão!”

“Deixa! Eu vou comprar. Olha, se eu ficar aqui vou dar uma resposta de atravessado para o infeliz. Fica que você é parente.”

Benedita foi à área de serviço, e colocou as mãos para cima. como se estivesse no tronco na época da escravidão, e cantou:

Eheheheheheheh

Eheheheheheheh

Eheheheheheheh

Eheheheheheheh...

“Vida de nego é difícil

É difícil como quê

Eu quero morrer de noite

Na tocaia me matar

Eu quero morrer de açoite...”

“Expedita leve a caipirinha para “El Barrigon”. Pena não ter encontrado cicuta para colocar na bebida do sovina.”

Mussolini afirma estar com a pressão alta, e que, por isso vai só molhar o bico. E, como molha... Serve-se de três generosas caipirinhas. A família recebe a visita de Rosilene. A mulher se oferece para arrumar a mesa, e, para isto pede os pratos mais bonitos, a toalha com bordados da Ilha da Madeira e os talheres do faqueiro.

El Ditador, impaciente faz cara de poucos amigos e abusa da grosseria. “Não precisa de tanta frescura para servir uma feijoada!”

O almoço é servido.

O homem faz o prato e dispara a comer. As amigas preocupadas com Romilda esperam pacientemente ,que ela se sirva. Enquanto isto, o guloso se agarra com um pedaço do rabo.

El Ditador repete e volta a repetir a feijoada. Lambe os beiços, pega uma laranja e dispara: ”Feijoada gostosa é a da minha mãe. Esta que vocês fizeram falta sustância. Falta gordura!”