Cântico de despedida
Águida Hettwer
 
D
espeço-me dos retratos sem molduras nas paredes da alma, que fingem risos em caras de choro. De contar centavos para pagar emoções vazias. Trancafiando desejos em nome dos “bons modos”. Digo adeus ao passado que ficou do outro lado da porta. Sigo em frente, sem rumo certo, mas certa de que estou no caminho.
 
   Despeço-me de sentimentos indigentes, que aprisiona muita gente. Comprometo-me a pintar um mundo de imagens paralelas, sem a miséria perambulando nas ruas. Num vago despertar e matizes de esperança, plumagens flutuando pelos ares.
 
 Até onde posso, despeço-me. Da solidão marcando presença, das palavras de indiferença, no ímpeto das ações, de gestos sem contornos de carícias. Quiçá dançar ao som de violoncelos, em notas musicais sorridentes. Em lembranças que tropeçam em meus desencontrados passos.
 
 Onde a vida perdure no crepúsculo, a palavra seja um canto, proponho-me a sonhar na complacência dos dias. As gotas se transformem em chuva, correm festeiras nos rios e deságuam curiosas no mar.
 
 
   Despeço-me! –Onde habita o silêncio.
 
 
04.01.2010