O Guri
Não sei o que me levou a agir daquela maneira, talvez estivesse contagiada pelo espírito natalino, ou levada por um impulso deixando de lado toda prudência. Era noite, o trânsito caótico, sinal fechado. Vi quando se aproximava dos carros um guri. Era miúdo, calção curto, pele curtida pelo sol, e de idade indefinida. Pedia esmola.
Ao chegar perto da porta, me estendeu sua mãozinha magra, de unhas sujas, mas no olhar transmitindo um apelo antes que qualquer palavra lhe saísse da boca. Costumo não abrir o vidro, mas nesse momento não pensei duas vezes. Peguei umas moedas, e coloquei na sua mão. Ele me agradeceu. Num impulso, olhei nos seus olhos e lhe disse: “Feliz Natal pra tu, visse?” Surpreso, o guri me olhou como que dissesse: “Eu só pedi uma esmola. Não esperava nenhuma palavra!”
De repente seu rosto se transformou num sorriso que vinha do fundo de sua alma. Pegando a mãozinha pequena, colocou na boca, tirou um beijo, e o jogou pra mim. Seus olhos sorriam. Meus lábios lhe devolveram um beijo fraterno. O sinal abriu, o guri saiu correndo e eu, como que em câmera lenta sai dali sentindo uma sensação tão sublime, tão especial. Com aquela orquestra tocando no meu coração, senti que a mesma coisa poderia está acontecendo no coração do guri.