Os castelos que construí e foram vários, de nada serviram para alimentar o que se esperava de mim. Eu tenho sido pouco. Na vida real, eu tenho lutado para manter-me, um servidor sem contestação e discreto do sistema, um cidadão covardemente irretocável, enfim um contribuinte afável que ajuda a engrandecer os anseios dos outros, que tiveram a coragem de realizar.

Eu sou o que os meus sonhos não puderam ser. Porque nunca os materializei e não o fiz, porque como sonhador faço versos, como se o mundo precisasse deles para alguma coisa. Os sonhadores escrevem no céu com as mãos sujas de suas verdades. Nada realizam porque quem sonha não faz e quem faz não sonha, além do mais são muito menores que os sonhos. Não sabem por onde começar para convertê-los em vida, muito menos sabem lidar com o peso do corpo atado ao chão da realidade que no fim odeiam. Odeiam tudo que é realidade, porque fogem dela para sonhar.

Precisam estar só, longe dos olhos amargos do mundo. Eu sou mesquinho demais, pequeno demais para ser qualquer coisa neste mundo, por isso sonho. Tudo é mais fácil nos sonhos. Se começasse a fazer as coisas, todavia, não começaria por onde começam nenhum sonho meu. Nem faria nada igual a eles.

Certamente, seguiria o que foi estabelecido pela lógica cartesiana da realidade rasteira dos conhecimentos atuais e pela inflexibilidade das regras criadas por homens que sabem fazer mas que estão ocupados demais  para sonhar como eu. Onde 2+ 2 é igual a 4. Nos sonhos não há matemáticas, há apenas sensações.

O mundo dos meus sonhos é irreal, por isso é belo e divino. Eu me lanço nele, sem pensar, como se lançam no ar, os papéis miúdos arrastados pelo vento, sem nenhum objetivo, sem nenhum horizonte, sem nenhuma ligação com o tempo, nem com resultados. Os sonhos meus são borboletas enlouquecidas de amor ou simplesmente ensimesmadas demais para sentir qualquer coisa que tenha relação com o mundo que habitam.  Não tem apego a nada, apenas voam no ar, sem sentido algum, pois se metamorfoseiam a cada instante, pela força absurda da cabeça limpa de dores.  Afinal tudo que tinha sentido, no fim descobre-se que não tinha sentido algum. Porque os homens morrem, suas forças se esgotam, seus sonhos de ter, de possuir, de querer, de amar, de acumular, de dominar, de vencer, de impressionar, terminam nas valas do nada, quando a consciência finalmente, os derrotam.
Os sonhadores adoram expor esta verdade!!

Mas afinal, meus sonhos são invencíveis, pois já não são nada e habitam outros universos tão obscuros a nós, que não podemos entendê-los. Os sonhos são as únicas coisas realmente minhas e nada valem para ninguém, nem para o mundo real, a não ser para mim. São naves que me levam fora dos meus pensamentos. São devaneios do meu ser que não pensa, mas apenas sente e ninguém pode ver o meu ser, mesmo que eu conseguisse emergi-lo à luz dia, seria invisível e intocável, por isso inútil para o mundo visual e orgástico dos homens. Os sonhos não pagam tributos por isso são desprezados. Eu, no entanto, sou eles e sou o que sou e nunca serei nada além do nada que sou.

No entanto tenho olhos que me prendem ao mundo. Esta superfície estúpida onde rola a existência e assim, vejo nesta noite de 31 de Dezembro, do alto de minha janela todas as realidades que perambulam pelas ruas nos rostos ora tristes, ora impassíveis das pessoas deste meu tempo. Elas não são feias, como feios são os seus andrajos de disfarces que usam para dissimularem. Acreditam no amanha que não conhecem e nem sabem se vai existir, acreditam num Deus que também não conhecem. Na verdade apenas temem tudo que não conhecem.

Agora, celebram o ano novo, como se o novo ano que está se formando nos horizontes das próximas horas, pudesse ser diferente do ano enfermo que se finda sem orgulho. Mas é um ano novo e a esperança misteriosamente se refaz nos olhos sem esperanças. Bebem, cantam, pulam, comem e resgatam a juventude adormecida e irão dormir felizes por uma noite. Enfim é a humanidade! Ela só tem braços para fazer e assim constroem o mundo e nós precisamos mais deles do que dos meus sonhos. Arre, (Bato três vezes na madeira) daqui a pouco virá o ano novo. Tragam-me o champagne que a vida agora pede alegria e sonhos e fora disso nada vale!! Feliz 2010!


Celio Govedice
Enviado por Celio Govedice em 03/01/2010
Reeditado em 01/01/2011
Código do texto: T2008132
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