EFEITOS COLATERAIS 



Ao se aproximar o Ano Novo as pessoas se empenham a bombar cada amigo com desejos de realizações e felicidade plena, em todos os sentidos.
É Ano Novo!

E agora? O que você vai fazer com essa nova chance de mudar de vida?
O que você tem feito a cada dia/oportunidade que cada nascer de sol lhe dá?
Por que precisa esperar uma data como esta, como marco, pra isso acontecer? E suas promessas, sempre renovadas, tão antigas?

Muitos nunca conseguirão 20% disso e os outros 80% virarão frustração.
Todo excesso faz mal, ainda que seja em expectativas de coisas boas. A felicidade, assim como a tristeza, quando são exageradas nos colocam em risco. Penso nas pessoas que bebem demais porque estão felizes e não voltam pra casa. Mas...

Quanto mais mensagens recebo, mais tensa eu me sinto. Elas são verdadeiras, eu sei. Até naquelas em massa eu acredito pois é um estado de espírito que toma conta de todos. Mas isso me trava. Eu não consigo devolver os votos, fico meio paralisada porque percebo um efeito colateral adormecido, uma mensagem subliminar que diz que você não está valorizando adequadamente a vida. Aí você sente culpa. Parece que todo mundo tem a obrigação de ser feliz 24 h por dia ainda que a realidade estampe outra coisa.

Isso me dá agonia. Penso em cada oportunidade perdida ou no tempo adiado das coisas que quis pra mim. E sinto um misto de desespero e culpa. O tempo passa, daqui a pouco já será meu aniversário de novo, pra eu lembrar que só fiquei mais velha, que a cada aniversário meu o meu tempo encurta. Que os meus planos têm que dar certo a médio pra curto prazo. Eu já não tenho mais um futuro longo. Cada digitozinho que troca é um pinguinho de veneno que vai matando aos poucos.

Quando me olho no espelho, não reconheço como minha a imagem que vejo. Onde está meu corpo de 17? Cadê minha bunda?... Meus peitos eram mais acima, minhas costas tinham formato. Eu tinha cintura, um umbigo perfeito e o pé mais bonito que já vi. Eu era linda! E burra, porque não enxergava isso. Aff...

Quando eu era criança, ficava observando as pessoas velhas. Daquele jeito devagar quase parando, com dor aqui e acolá, com aquelas roupas sem graça, um olhar tristonho e a pele de sharpei, e pensava: Nunca vou ficar assim. Eu sou novinha. São as pessoas que escolhem se acabar.

De certa forma eu não estava, de todo, errada. Podemos escolher o que vamos comer, podemos escolher não nos intoxicarmos e pensar sempre positivo. Afinal, quem está melhor é isso que fala, então devem estar certos. Só que os resultados chegam sorrateiramente e quando menos esperamos... Bum! Já é tarde. Lá estou eu no caminho de ser velha, como eu disse que jamais seria. E não sei o que fazer com isso. Talvez devesse pensar em como eu sou feliz, outra coisa que eu acho piada. Pra mim, o velho que diz que é feliz é pra consolar-se. Aí ele finge-se de retardado e vive sorrindo. Será isso felicidade? Não sei se vou querer descobrir.

Ainda não entendo o porquê de eu ficar mais bonita nas fotos. Pareço ter menos 15 ou 20. E alguns defeitinhos eu corrijo no Photoshop. Pelo menos isso eu aprendi e me alivia.
Tirar fotos de biquíni? Nem pensar. Já tentei de todas as formas e não há Photoshop que engane minha natureza a cinco meses dos meus 52. Meu tempo de auge passou. Já fui algo atraente, mas essa coisa dura tão pouco que deve ser por algum tipo de pré vingança da vida. Tipo, pra você ver no que se tornou e sua imagem no espelho lhe dizer: Está vendo? Com um dedo na sua cara.

Ô, vida. Eu quero minha vida nova de novo. Aquela vida que eu tinha antes e que cada Ano Novo que comemorei foi matando, escondido.

Mas eu não quero morrer. Eu gosto de saber que ainda tenho vida, que sou dona do meu destino e de que tudo o que acontece comigo é o resultado das minhas escolhas. E que sou eu que escolho, sempre.
Só queria que a medicina fosse mais rápida do que eu e descobrisse um elixir da juventude. E que ainda que fosse em doses homeopáticas, eu tomaria gota a gota, pacientemente, se soubesse que estaria voltando atrás, retornando ao princípio, onde eu tinha viço, onde meu corpo tinha elasticidade, onde eu tinha 32 dentes perfeitos, onde eu pegava um cavalo e sumia campo afora em disparada, onde eu pegava uma moto e acelerava a 100 km/h numa estrada só pelo prazer de sentir o vento batendo na cara, onde o sol só fazia carinho em minha pele e me deixava dourada.

Hoje, minha pele não suporta o sol, já deixei de fazer muito, não quero mais correr riscos. Estou perdendo o controle que eu tinha. Estou ficando com medo do mundo, de tudo.
Apesar disso eu não sou amarga ou infeliz. É que em momentos assim, de comemorações, é hábito meu eu me recolher e introspectar. Eu necessito desse tempo pra mim. Se você não conseguir enxergar a sua realidade não vai poder purificar-se.
E é só isso que eu desejo a todos: Purificarem-se.
Porque o restante acontece ou não, apesar de você ou nem sempre, mas isso é você quem vai levar.

Feliz Ano Novo!

Que você aproveite cada Dia Novo sob o sol,  que antes de tudo saiba perdoar-se por suas incapacidades e que aceite a si mesmo exatamente como você é. Tenha paciência e amor por si próprio acima de tudo.
Queira coisas, mas na medida certa, as do tamanho das suas mãos. Expectativas demais remetem a frustrações desnecessárias e podemos viver bem se soubermos valorizar o que já conquistamos.

Sintam-se, por mim, abraçados.

Ana Átman
Enviado por Ana Átman em 31/12/2009
Reeditado em 31/12/2009
Código do texto: T2005173
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