BRINCOS

Hoje meu brinco caiu no vaso do banheiro. Ele caiu de minha mão como grãos de areia cairiam: inevitavelmente. Foi horrível a sensação de vê-lo longe do meu alcance, sendo levado pela força da descarga e, posteriormente, de não mais o ver.

Uma amiga contou-me que, certa feita, perdeu um querido brinco no ralo da pia. Ela deve ter sentido a mesma angústia que experimentei.

Acho que todas as mulheres já sofreram essa terrível punhalada. Um brinco caído na calçada, escondido entre as frestas, rendido ao abismo de um bueiro. Separar-se de algo que integra seu ser. É uma parte sua que repentinamente se vai. Pior de tudo é que sempre fica o outro para contar a história do que se foi e a perda torna-se um martírio para o resto de sua existência.

Lembro-me de um brinco de prata com ametista hexagonal que me deixou quando eu ainda era criança. Foi no veraneio de 1988 quando, ao sair do mar depois de inúmeras ondas vencidas, percebi que me faltava um pedaço.

Chorei demasiadamente desculpada pela infância que, infelizmente, não mais me acoberta para que eu possa lamentar as perdas atuais. Iemanjá levara meu brinco para as profundezas do Atlântico e legou-me apenas lágrimas salgadas.

Iemanjá leva brincos. E o amor quem leva? Afinal, ele também se vai como os brincos que deixam sempre uma sobra para contar história, perdurando até o fim de nossos dias. O amor deixa cicatrizes porque para ir precisa ser extirpado com incisuras que penetram até a alma.

Nenhuma união é tranquilamente desfeita. Por onde o amor passou não há lugar para a indiferença. Quiséramos todos nós que ele nunca se fosse. Contudo, desgraçadamente, o amor se vai, é levado por alguém, pelo tempo, pela distância ou até mesmo pelos céus. Quem o perde sofre, quase morre pela ida e vive pela presença completa de um dia e pela permanente ausência incompleta de quem foi.