A sigla
A sigla, pensei, deve ter sido inventada por falta de papel. Mas, ao se falar de espaço, inclui-se aí o tempo, pode ter sido também por pressa; o que sempre ocorre, nos dias de hoje, quando nossas ausências, até a de não visitar nossos entes mais queridos, justificam-se com a costumeira desculpa: falta de tempo. E, por isso, tudo se abrevia, até o carinho.
Siglar é coisa antiga. O patrimônio do império romano memoriza sua história, em Roma e outras partes do mundo, com a sigla gravada em pedras e metais: SPQR (Senatus Populusque Romanus), que é o acrônimo de: “O Senado e o Povo Romano”. Iniciais que se aproveitam, também, para gracejo: Sono Pazzi Questi Romani (são loucos estes romanos). Lembro-me de que, ainda criança em Pilar, nas aulas de catecismo, perguntava a Dona Vicenza sobre o que significavam as letras na cabeça da cruz: INRI (Iesus Nazarenus Rex Iudeorum). Ela não sabia e, assim, fazia que não ouvia a minha pergunta. Somente mais tarde, já meninote em Itabaiana, as freiras do Colégio Nossa Senhora da Conceição, que em tudo escreviam CNSC, despertaram-me a velha curiosidade de perguntar sobre a cruz. E elas me traduziram, do latim, a ironia siglada da colonização romana: “INRI quer dizer: Jesus Nazareno, Rei dos Judeus”. No momento, tenho decorado a sigla a do meu trabalho: IPHAEP (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado da Paraíba) e as outras subsequentes mais difíceis, como CPDCHJP. Em 1973, ganhei um grosso dicionário de siglas e abreviações. Logo percebi que o volumoso livro, a mim regalado, depois de editado, já estava desatualizado. A mania de siglação é extravagante, não respeita nem mesmo nome próprio. Por que a abreviação “Mª” para o breve e doce nome de Maria? Ao assinar um contrato, estranhei que o contratado fosse JACA, enfim seu nome: Jovino Alves Cabral de Alcântara. Mesmo em atos solenes como esse, deparamo-nos, nos convênios, até com a magnífica Pontifícia Universidade de Milão ao ser chamada por PUM.
A abreviação faz e não desfaz ignorâncias ortográficas: “Atenciosamente” se escreve com “s” ou com “z”? Respondeu-lhe o Chefe da repartição: - Muito longo, agora só se usa “att”.
Além dessas inconveniências, as abreviações criam um dialeto paralelo ao vernáculo. São consoantes que se sucedem sem formar frases por não possuírem verbo; tampouco palavras, por não terem vogais; e, quando as têm, redundam cacofonias. Na internet, a conversação não é o nosso idioma corrente. Até me pergunto como um jovem, habituado àquele pobre linguajar, escreverá uma redação no exame de vestibular ou, futuramente, algum texto, objeto da sua profissão. Habitua-se a agradecer com um “obg”; beijar com um “bj” ou abraçar com “abç”, tão curtos que não chegam a ser um aperto de mão. Haja paciência, como teve o saudoso Professor Manoelito Gomes, ao ouvir, sorridente, seus alunos falarem, alto e bom som, as iniciais do seu excelente educandário, quando ele era diretor do Colégio Universitário.
A sigla, pensei, deve ter sido inventada por falta de papel. Mas, ao se falar de espaço, inclui-se aí o tempo, pode ter sido também por pressa; o que sempre ocorre, nos dias de hoje, quando nossas ausências, até a de não visitar nossos entes mais queridos, justificam-se com a costumeira desculpa: falta de tempo. E, por isso, tudo se abrevia, até o carinho.
Siglar é coisa antiga. O patrimônio do império romano memoriza sua história, em Roma e outras partes do mundo, com a sigla gravada em pedras e metais: SPQR (Senatus Populusque Romanus), que é o acrônimo de: “O Senado e o Povo Romano”. Iniciais que se aproveitam, também, para gracejo: Sono Pazzi Questi Romani (são loucos estes romanos). Lembro-me de que, ainda criança em Pilar, nas aulas de catecismo, perguntava a Dona Vicenza sobre o que significavam as letras na cabeça da cruz: INRI (Iesus Nazarenus Rex Iudeorum). Ela não sabia e, assim, fazia que não ouvia a minha pergunta. Somente mais tarde, já meninote em Itabaiana, as freiras do Colégio Nossa Senhora da Conceição, que em tudo escreviam CNSC, despertaram-me a velha curiosidade de perguntar sobre a cruz. E elas me traduziram, do latim, a ironia siglada da colonização romana: “INRI quer dizer: Jesus Nazareno, Rei dos Judeus”. No momento, tenho decorado a sigla a do meu trabalho: IPHAEP (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado da Paraíba) e as outras subsequentes mais difíceis, como CPDCHJP. Em 1973, ganhei um grosso dicionário de siglas e abreviações. Logo percebi que o volumoso livro, a mim regalado, depois de editado, já estava desatualizado. A mania de siglação é extravagante, não respeita nem mesmo nome próprio. Por que a abreviação “Mª” para o breve e doce nome de Maria? Ao assinar um contrato, estranhei que o contratado fosse JACA, enfim seu nome: Jovino Alves Cabral de Alcântara. Mesmo em atos solenes como esse, deparamo-nos, nos convênios, até com a magnífica Pontifícia Universidade de Milão ao ser chamada por PUM.
A abreviação faz e não desfaz ignorâncias ortográficas: “Atenciosamente” se escreve com “s” ou com “z”? Respondeu-lhe o Chefe da repartição: - Muito longo, agora só se usa “att”.
Além dessas inconveniências, as abreviações criam um dialeto paralelo ao vernáculo. São consoantes que se sucedem sem formar frases por não possuírem verbo; tampouco palavras, por não terem vogais; e, quando as têm, redundam cacofonias. Na internet, a conversação não é o nosso idioma corrente. Até me pergunto como um jovem, habituado àquele pobre linguajar, escreverá uma redação no exame de vestibular ou, futuramente, algum texto, objeto da sua profissão. Habitua-se a agradecer com um “obg”; beijar com um “bj” ou abraçar com “abç”, tão curtos que não chegam a ser um aperto de mão. Haja paciência, como teve o saudoso Professor Manoelito Gomes, ao ouvir, sorridente, seus alunos falarem, alto e bom som, as iniciais do seu excelente educandário, quando ele era diretor do Colégio Universitário.