O Pobre e o Teatro

Entre o pobre e o teatro sempre existiu uma barreira enorme que os distanciava um do outro. O teatro ficou durante toda a história, nas mãos da elite e/ou do Estado, como nós rapper chamamos de "na mão do sistema". Se o pobre participou do teatro algum dia, a história ocultou. História esta escrita por quem tinha o acesso á escrita, se hoje em dia, século XXI, o acesso já é restrito imaginem á vinte séculos atrás como que era.

Em todo o mundo e inclusive no Brasil o pobre sempre viu o teatro como uma coisa de outro mundo, e não sem motivos concretos como, por exemplo, as peças apresentadas em São Paulo na metade do Séc. eram faladas em outro idioma e sem legendas, eram nas regiões centrais e os ingressos custavam caros. Quer mais? Os assuntos também tratados nas peças eram aristocráticos, sobre ricos, heranças, ou imitações de peças européias que não diziam nada sobre a realidade brasileira. Pra se ter uma idéia de tal elitismo, veja a situação racial, se os pobres estavam fora deste ciclo erudito imaginem os negros, mas houve lugares e montemos que eles até participaram, mas para isso tinham que pintar seus rostos de branco, pareciam palhaços, imagem ridicularizada e estereotipada, parecidos com as novelas que só colocam negros para representarem escravos e bandidos nas telas. E quando, nas grandes peças, havia personagens negros os atores brancos pintavam o rosto de preto e faziam o personagem com toda elegância e glamour possível, ao invés de convidar um negro para fazer o papel e lhe oferecer trabalho digno e ascensão social.

E as vestimentas também eram fora da realidade, eles enfeitam o máximo a cozinheira que parecia uma noiva com aqueles vestidos longos e cheios, maquiavam a pobreza para não chocar a vista da platéia (branca).

No Brasil o primeiro momento registrado de tentativa de rompimento deste antagonismo foi com a montagem da peça "Eles não usam Black-Tie" de Guarnieri encenada no Teatro de Arena de São Paulo na época da ditadura militar causando um grande impacto por colocarem em cena pessoas comuns, com roupas comuns falando de sua época, a peça foi censurada.

Na área da escrita teatral o homem que mais representou o pobre com seriedade e respeito foi o Plínio Marcos muito criticado pelos conservadores.

E depois de tanto tempo o pobre continua afastado do teatro, ou pelo menos dos "Grandes Teatros", os motivos não mudaram muito: falta de dinheiro, distância e identificação.

Mas hoje na periferia o teatro não pára de crescer, não o teatro com grandes cenários, belos figurinos, atores conhecidos nacionalmente, com textos clássicos da literatura, mas o teatro feito por grupos de jovens utilizando poucos recursos técnicos e falando sobre coisas comuns para as pessoas comuns e de suas comunidades com textos criados, na maioria dos casos,

coletivamente, e, quando não, fazem adaptações de clássicos sendo na sua maneira voltados a sua realidade como o caso do grupo do Itaim Paulista "Primeiro Comando Teatral" que adaptaram o clássico do teatro mundial de todos os tempos "Hamlet" de William Shakespeare, do jeito que sabiam e queriam. E outro exemplo relevante é o Grupo Teatral Cervantes que adaptou "Os Fuzis da Sra. Carrar" do alemão Bertolt Brecht, e foram acusados de fazer apologia ao crime, por um pesquisador de teatro da USP.

Esse teatro de contestação já existia, mas não era notado e cresceu na gestão da prefeita Marta Suplicy com o projeto Teatro Vocacional e com a criação e implantação dos CEUs, fato que gerou críticas preconceituosas do tipo "Pra quê construir teatros tão bonitos em lugares tão feio?" e mais "Para quê fazer teatro para os pobres se eles não entendem?"

Eles não entendiam ou não aceitavam idéia do pobre fazer e assistir teatro.

Por que será? Será que isso tornaria as pessoas pobres mais inteligentes e contestadoras?

Emerson Alcalde
Enviado por Emerson Alcalde em 26/12/2009
Reeditado em 29/12/2009
Código do texto: T1996870