SEM NADA
 
            É o dia seguinte ao Natal que não foi, ou não se completou. Só Eu era natal.

          Antes foi tal alvoroço, tanta novidade surpreendendo. Havia esperanças se oferecendo. Parecia que a magia resolvera se aproximar e antecipar coisas boas. Tal! Acreditei.
          Presentes para o filho: amor em cada peça escolhida e comprada num sentimento antecipado de ele ficar alegre por ser tão querido.
          Para a namorada dele também, seguindo as recomendações dele quanto ao gosto dela.
          Para a filha querida seria o melhor e mais precioso presente tão grande o apreço a ela.

          E apareceram os netos. Algo maravilhoso abrindo um novo acontecer de vida.  Como um recomeçar. Mesmo para quem não tem um futuro. Mesmo assim, abriu-se uma porta de magia indizível, mais que uma esperança, uma nova certeza.
          Para quem não tem o que gastar, o dinheiro foi amplamente usado sem ver os preços, só os conteúdos de livros maravilhosos escolhidos com encantamento.

           É quando a esperança se confunde com a certeza. Perigoso estado de espírito, pois se enxerga tudo com cores promissoras.
            
          Mesmo com os joelhos impedindo movimentos, compras das melhores iguarias para a Ceia, fartura visando o maior sabor, sabor-aquele que alegra e que comemora a alegria.

            A casa arrumada, flores, o trigo e flores de vime ladeando o presépio simples, mas de tanto significados explícitos. 

          Tantos encontros e falas construídos e trocados, como corações pulsantes e abertos, como nunca tinham se falado, tanto entendimento!

 Espero que este verde fale mais do que eu que não consigo falar. 

          É um algo que quis ser e acreditou que seria. Mas não foi. 

          Os netos desmarcaram o encontro combinado após o  Natal, que seria hoje, 26/12/09.
          
          O filho querido viajou com a namorada para longe do “isto aqui”, há três horas daqui para exatamente “não ficar o Natal junto em família”.Querem um mundo só para eles. 

          A comida sobra e transborda das vasilhas na cozinha. Os alimentos nem acabados, de tantos, deterioram ignorados.


            Ficamos eu e minha filha, mudas pelo espanto, e quase incredulidade indagativa... Sem questões. Sem perguntas. Sem falas.

            Ela aguarda chegar dia 28 com o vazio na alma, pois o trabalho e o amor não lhe estão sendo favoráveis no momento, ou seja, está mais ligada aos que não lhe são do que a si mesma e ao que ela é.
            Não aguardo nada. Eu deixei de ser alguma coisa. 
            Só deixei de ser.

            Não importam os restos da festa que não houve. 

            Quem tapeou quem? 
            Quem nada lucrará e que o tempo dirá?

 
            Uma barata jaz morta na frente do meu quarto de ar condicionado: atraída por certo, pelos restos da festa ou dos frutos nem retirados de seus pacotes. 

            Foi talvez, a única testemunha concreta de uma festa que iria acontecer.

            Era hora das cortinas se fecharem nesse palco da vida.

            Mas a vida se ausentou e nem cortinas precisam ser fechadas