BOB
Ele era lindo. Branco, porte elegante, peito empinado, andar bamboleante. Pequenino ainda já tinha sua companheira escolhida. Também branca, pequenininha, mais baixinha do que ele. Brincavam e não viam o tempo passar.
Seu nome era Bob. Sua pequena companheira de infância, se chegou a ter um nome, eu não lembro. Uma noite aconteceu o inevitável. Dormiam tranquilamente, quando roubaram sua pequena amiga indefesa. Bob, pequeno ainda, não pode defender sua prometida. Nem que quizesse. Como poderia ele competir com uma raposa? E ela matou a pequenina gansa.
Sim, porque Bob era um ganso. Um ganso que foi dado de presente, por minha irmã, junto com a fêmea, para deleite de meus sobrinhos. Há muito, muito tempo. Creio que há quinze anos atrás.
Assim, Bob foi crescendo sozinho, cercado de carinho, ficando mais bonito a cada dia, na sua plumagem branca e seu porte de rei. Mas estava sozinho, sem um de seus iguais e a solidão o deixava triste e cabisbaixo.
Nessa época, lá pelos idos de 1994, minha mãe criava algumas galinhas, aquelas vermelhas, grandes, bonitas e garbosas. Viviam elas num grande cercado, alegremente, botando seus ovos diários. Não havia galo no terreiro. Daí veio a idéia , para diminuir a solidão do Bob, de colocá-lo junto das galinhas. Ele se adaptou de tal maneira que, à noite, só entrava no "galinheiro" depois que todas as suas amigas estavam empoleiradas, prontas para dormir.
O tempo foi passando, Bob cresceu e virou o ganso mais lindo que já se viu. Se bem que, as vezes, na falta de água para o banho, enfiava-se em qualquer poça de água feita pela chuva e aí já se viu... De alvo, mudava para tons que variavam do marrom ao cinza, todo malhado. Parecia um soldado disfarçado para a guerra. Aí, dá-lhe banho de tanque ou mangueira para deixá-lo branquinho e lindo outra vez.
Já disse que as galinhas eram vermelhas, bem empenadas e bonitas. Um dia minha mãe, olhando sua "criação", deu um grito (típico das italianas) e exclamou: "alguma doença está afetando essas galinhas, pois a cada dia perdem penas". Era pena no terreiro, pena no galinheiro, só faltavam penas nas galinhas.
Minha mãe, que não nasceu ontem, desconfiou e deu uma de Scherlock Holmes. Passou a observar o movimento do terreiro. E qual não foi sua surpresa ao se deparar com uma cena inusitada: o Bob, desesperado, correndo atrás de uma das penosas, que gritava cocoricó a plenos pulmões. Todos sabem como é o bico de um ganso. Pois então. No seu afã de "namorar", o máximo que Bob conseguia era segurar as penas da galinha e, como ela corria, a pena se soltava. Nas suas tentativas frustradas, Bob foi ficando cada dia mais infeliz e as penosas cada dia mais peladas.
Conclusão: tivemos que dar o Bob. Mas esta história, mesmo sendo verdadeira, terminou como um belo conto de fadas. O novo dono do Bob tinha uma chácara, com laguinho e umas trinta gansas, que sofriam a solidão de não ter um ganso para compartilhar seu amor.
Resultado: Bob, que já tinha porte e figura de rei, passou a reinar em seus próprios domínios, com um harém fiel e cordato.
Todos foram felizes para sempre!