SALDO

O saldo é positivo ou negativo? Depende dos olhos, e também do bom senso, dos que lêem a placa.

Eu caminhava displicente, com meu ar insignificante pela rua da feira. Ia, aborrecido e inquieto, à procura de um livro para de sanar a frustração de pouco antes — comprara um refrigerador DUPLEX, quando deveria comprar um simples, como minha esposa desejava.

Ainda desligado e impaciente — as mulheres têm mania de desanimar os homens, se eu fosse de beber, já estaria mais do que bêbado numa hora dessas — parei na primeira banca de livros. Olhei para o cartaz feito de cartolina branca sobre uma pilha de livros velhos e bagunçados. Não acreditei de imediato no que estava escrito. Ele deve ter esquecido um zero, pensei ao reler o anúncio: LIVROS POR R$1,00.

Louco por livros, não hesitei um segundo, lancei-me àqueles volumes amarelados. A reunião literária era das melhores, entre eles estavam Dickens, Márquez, Drummond de Andrade, Caminha, Vinícius, Eça, Namora e os Silvas da vida — quase anônimos em meio as glórias de tantos imortais — ali pilhados, empoeirados e jogados. Todos por um real.

Sem pensar duas vezes, fui enchendo as mãos, o lado do balcão e olhando desconfiado àqueles que despretenciosamente folheavam algum livro próximo a mim. Nessas horas me sentia um marido traído. — Quem eram aquelas pessoas se engraçando com minhas preciosas amantes? Tantas mãos descuidadas amassando meu tesouro. Aquilo tinha de parar. Eu enlouquecia.

Fiz minhas escolhas com muita dificuldade — o dinheiro é curto e não podia me empolgar — paguei ao senhor Livreiro, que, feliz, se livrava de mais um fardo, diminuíra o peso da mala que levaria para casa.

Ao me afastar, comecei a pensar no descaso dos leitores, do tempo e me preocupei. Como eu reagiria se naquela imensa pilha encontrasse um livro meu?