Os e-mails indesejáveis
Cissa de Oliveira
A única coisa boa que cai do céu por conta própria, que se saiba, é a água. Ainda assim, de vez em quando ela vem com tamanha vontade que assusta, e como se não bastasse, falta quando menos se espera. Vocês poderiam me questionar agora, falando sobre o sol. – Ele também não vem do céu? Não, eu diria, ele é tão somente uma estrela gigante e assanhada, muitas vezes totalmente encoberta aos nossos olhos quando chove, ou então, inclemente, se não há no céu uma nuvem. Pronto, voltamos à água.
E a lua? Mas por que diabos as pessoas perguntam tanto? Sim! E os pássaros, os aviões, os insetos, os anjos e tudo o que voa, incluindo-se aí os morcegos, todos têm, também o seu pedaço de céu. Mas esses, eu diria em minha defesa, só caem ou por descuido ou de maduros, com exceção das luas, na sua sempre particular chuva aos poetas. Querem ver um exemplo: os e-mails. Acreditem, eles também têm asas. Mas há aqueles - esperados, necessários, que nos fazem pular de alegria, chorar de emoção, confirmar grandes negócios financeiros, conhecer o caçula da família que nasceu no outro lado do mundo, enfim, esses que nos deixam literalmente “linkados” com o universo - e aqueles descartáveis. E não há etiqueta – existem normas de etiqueta para a internet, sim, – que os segure.
É propaganda de viagra, pomada, colete à prova de bala, reza daquelas bravas, pedido de ajuda falso, foto de homem e mulher pelados, curso de leitura rápida, de massagem, de cozinhar, de informática, de tudo e também de nada. É o diabo, entoando bem alto uma música para os condenados. Condenação: ter a caixa lotada. E como diz a música e a sabedoria popular “laranja madura, na beira da estrada, ta bichada ou tem maribondo no pé”. O maribondo no caso pode ser um vírus. Ou uma bobeada. Ou simplesmente uma perda de tempo.
Dá até vontade de voltar à época das cartas. Da letra caprichada ao máximo. Do perfume predileto entre as dobras bem planejadas do papel bonito. De Deus estampado na foto em preto-e-branco tão esperada, assim como no pedido de desculpas pelos pequenos erros na escrita, e até no atraso com que chegavam as notícias.
Depois, inventaram a tal da carta-bomba. Puro terrorismo. Vai ver, era já o prenúncio do que se daria nestes tempos de e-mails indesejáveis, chovendo mais do que tempestade de canivetes em telhado de casa térrea.
Da série: “Deus e demo na terra do silêncio”