- VOCÊ NASCEU EM BERÇO DE OURO.
Frase recorrente na vida de Cecília com sua família, frente às dificuldades vividas no passado, por seus irmãos mais velhos.
Cecília era a mais jovem da família, única menina, nascida na maturidade dos pais. Crescera em meio a adultos e muito mimada por todos, principalmente por seu pai. A mãe a super protegia, devido a uma doença grave que Cecília tivera ainda muito nova. Mas aos olhos de seus pais, esta impressão de fragilidade a acompanharia por toda vida.
Esta fragilidade vista por sua família alcançava a escola, as brincadeiras com outras crianças, as reuniões de família.
- CECÍLIA É FRÁGIL, CUIDADO!
- FIQUE SENTADA, CECÍLIA! COMO MOCINHA!
Os anos passaram e Cecília passou a caminhar por conta própria. Mas as frases recorrentes permaneceram:
- VOCÊ ESTÁ MUITO PÁLIDA!
- VOCÊ ESTÁ COM OLHEIRAS, NÃO ESTÁ ANÊMICA?
- TEM SE ALIMENTADO?
Esta aura de desproteção, de fragilidade, deve ter incorporado em Cecília, pois de filha mimada passou à esposa mimada.
Além de mimada, Cecília era invejada.
Bonita e articulada, não demorou a se cansar das manifestações de ciúmes do esposo, deixando-o desolado e inconformado com o divórcio. Afinal, mais do que frágil, ela era mimada.
Nunca faltou quem a quisesse, aumentando ainda mais a inveja. E todos, sempre dispostos a mimá-la. Era contagiante, pois até seus amigos a paparicavam e a protegiam, como se fosse um cristal.
Algum tempo depois, casou-se novamente. E continuou sendo mimada por seu novo marido, por seus familiares, por seus amigos e por seu ex-marido, que não se conformava.
Cecília nunca precisou trabalhar por seu sustento, sempre tendo tudo que queria. Herdou de seus pais bens e um pecúlio mensal por toda vida (dinheiro que nunca precisou participar ao esposo, pois este lhe dava tudo). E não bastando tanta sorte, Cecília continuava disseminando paixões. Soube de um que se apaixonou pela voz, ao falar com ela ao telefone. Nunca a conheceu pessoalmente, pois Cecília, apesar de atraente, era fiel.
Mas fiel a ela mesma, se cansou também de seu segundo e devotado esposo.
Mesmo já madura, com algumas marcas do tempo no rosto, Cecília arrebatava pessoas e amores. Novamente, uma fila de pretendentes, apaixonados e devotados. Cecília, novamente, podia escolher.
E assim continuou Cecília, rodeada de mimos e invejada.
Onde está a diferença? Onde está o ponto determinante que faz Cecília ter tudo, enquanto outras nada tem?
O que faz uma pessoa ser protegida, mimada e paparicada sempre e por todos?
Beleza? Não. Há mulheres lindas, muito mais que Cecília, mas a beleza não impediu de serem ultrajadas.
Os mimos de seus pais e irmãos? Não. Quantas sucumbiram à vida por inexperiência.
Penso que algumas mulheres nasceram princesas, e como tais, cercadas de súditos. E neste conto de fadas, para cada bruxa malvada há um príncipe encantado para proteger a princesa.
A carruagem de Cecília não se transforma em abóbora.
Imagem: lembrancinhas.parabatizado.com.br