Morrendo de saudade
Acabo de chegar de São Paulo. Estive na fria Sampa durante uma semana, comendo do bom e do melhor. Bons vinhos ajudaram-me a suportar a baixa temperatura que, em determinadas horas, descia a menos de 15 graus. Criado no calor do Nordeste, nas horas de muito frio, sentia-me como se estivesse em férias na Sibéria.
Nos meses de junho e julho é quando São Paulo é mais gostoso. Não tem relâmpago; não tem trovão; nem chuva forte. A cidade tem um solzinho acanhado; e dorme e acorda com a garoa acariciando seus arranha-céus.
Como não tinha absolutamente nada para fazer, resolvi curtir o frio, lendo um bom livro, aproveitando, inclusive, as primeiras horas do dia.
Decisão que não agradou ao meu filho Adriano, que me hospedava, com o carinho de sempre. Preferia ver-me correndo ao seu lado, todas as manhãs, no Parque do Ibirapuera. No belo parque paulistano ele faz com Juliana, sua mulher, o seu arrojado cooper.
*** *** ***
Comprara na FNAC o livro intitulado O mundo Acabou, do jornalista Alberto Villas, que depois me deu munição para escrever esta insulsa crônica.
Comecei a rabiscá-la ainda em São Paulo, após andar por algumas ruas da capital paulista verificando se era verdade o que lera no citado livro. Vejam como foi.
Manhã paulistana. Caía uma forte neblina sobre a cidade. Entrei numa sapataria chique, e pedi um par de galocha. O jovem vendedor, meio atordoado, desculpando-se, insinuou que galocha era coisa do passado. Agradeci, e fui em frente.
Entrei numa loja de cosméticos e perfumes caros, na Rua Augusta. À mocinha do balcão pedi dois vidros de Glostora. E ela, aparentando ter uns vinte anos, foi logo me dizendo: "Glostora? Não sei do que o senhor está falando." Nem tentei explicar-lhe o que era Glostora. Agradeci a atenção, e fui em frente.
Em um barzinho da Brigadeiro Luiz Antônio pedi um Crush bem gelado. Com sotaque cearense, o garçom me disse não dispor da bebida. Lembrou, que bebera o último Crush quando tinha "dez anos de idade", em sua terra natal, o Juazeiro do Norte. E acrescentou: "E já estou com vinte e cinco, doutor."
Tomei uma Coca-cola, abracei o pai-d´égua conterrâneo, e me mandei.
Passando por uma confeitaria, na Consolação, descobri lindos cachimbos na sua vitrine. Perguntei ao dono da confeitaria se ele também vendia piteira. E ele: "Piteira, moço, não temos, e já faz um bom tempo. Não quer levar um cachimbo?" Disse-lhe que não fumava.
Despedi-me, deixando-o com a cara de quem queria perguntar: "Se não fumas, pra que piteira?"
Terminei minha peregrinação em uma grande farmácia, nas proximidades da Frei Caneca. Solicitei à loira balconista alguns remédios, entre eles, Pílulas de vida do Dr. Ross; Óleo de risino; Óleo de fígado de bacalhau; e um frasco de Entorovioformio.
Uma jovem farmacêutica apareceu, e, exagerando, disse ao seu vetusto cliente: - "Senhor, por favor, já estamos no Terceiro Milênio. Estes remédios são do tempo em que farmácia se escrevia com Ph e era chamada de botica." Entendi a gozação, e dei no pé.
De volta ao apartamento do filho, em Vila Nova Conceição, um bairro agradabilíssimo, comecei a rascunhar esta crônica, prometendo terminá-la tão logo chegasse na Bahia.
Em Salvador, li as últimas páginas de O mundo acabou morrendo de saudade dos tempos do Calcigenol; do Elixir Paregórico; do sapato Vulcabrás; do disco de Vinil; da bomba de Flit; do papel almaço; da goma arábica; dos maiôs Catalina; dos sabonetes Lever e Eucalol; da camisa Volta ao Mundo, e do dropes Dulcora.
Do penico de porcelana, e de outras coisas mais recordadas por Alberto Villas, com inteligência e humor, no seu interessante trabalho.
Oh! O mundo era outro. Esse, sim, acabou.
Pelo menos para este provecto cronista, um sujeito, como sempre, cheio de saudades...
Acabo de chegar de São Paulo. Estive na fria Sampa durante uma semana, comendo do bom e do melhor. Bons vinhos ajudaram-me a suportar a baixa temperatura que, em determinadas horas, descia a menos de 15 graus. Criado no calor do Nordeste, nas horas de muito frio, sentia-me como se estivesse em férias na Sibéria.
Nos meses de junho e julho é quando São Paulo é mais gostoso. Não tem relâmpago; não tem trovão; nem chuva forte. A cidade tem um solzinho acanhado; e dorme e acorda com a garoa acariciando seus arranha-céus.
Como não tinha absolutamente nada para fazer, resolvi curtir o frio, lendo um bom livro, aproveitando, inclusive, as primeiras horas do dia.
Decisão que não agradou ao meu filho Adriano, que me hospedava, com o carinho de sempre. Preferia ver-me correndo ao seu lado, todas as manhãs, no Parque do Ibirapuera. No belo parque paulistano ele faz com Juliana, sua mulher, o seu arrojado cooper.
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Comprara na FNAC o livro intitulado O mundo Acabou, do jornalista Alberto Villas, que depois me deu munição para escrever esta insulsa crônica.
Comecei a rabiscá-la ainda em São Paulo, após andar por algumas ruas da capital paulista verificando se era verdade o que lera no citado livro. Vejam como foi.
Manhã paulistana. Caía uma forte neblina sobre a cidade. Entrei numa sapataria chique, e pedi um par de galocha. O jovem vendedor, meio atordoado, desculpando-se, insinuou que galocha era coisa do passado. Agradeci, e fui em frente.
Entrei numa loja de cosméticos e perfumes caros, na Rua Augusta. À mocinha do balcão pedi dois vidros de Glostora. E ela, aparentando ter uns vinte anos, foi logo me dizendo: "Glostora? Não sei do que o senhor está falando." Nem tentei explicar-lhe o que era Glostora. Agradeci a atenção, e fui em frente.
Em um barzinho da Brigadeiro Luiz Antônio pedi um Crush bem gelado. Com sotaque cearense, o garçom me disse não dispor da bebida. Lembrou, que bebera o último Crush quando tinha "dez anos de idade", em sua terra natal, o Juazeiro do Norte. E acrescentou: "E já estou com vinte e cinco, doutor."
Tomei uma Coca-cola, abracei o pai-d´égua conterrâneo, e me mandei.
Passando por uma confeitaria, na Consolação, descobri lindos cachimbos na sua vitrine. Perguntei ao dono da confeitaria se ele também vendia piteira. E ele: "Piteira, moço, não temos, e já faz um bom tempo. Não quer levar um cachimbo?" Disse-lhe que não fumava.
Despedi-me, deixando-o com a cara de quem queria perguntar: "Se não fumas, pra que piteira?"
Terminei minha peregrinação em uma grande farmácia, nas proximidades da Frei Caneca. Solicitei à loira balconista alguns remédios, entre eles, Pílulas de vida do Dr. Ross; Óleo de risino; Óleo de fígado de bacalhau; e um frasco de Entorovioformio.
Uma jovem farmacêutica apareceu, e, exagerando, disse ao seu vetusto cliente: - "Senhor, por favor, já estamos no Terceiro Milênio. Estes remédios são do tempo em que farmácia se escrevia com Ph e era chamada de botica." Entendi a gozação, e dei no pé.
De volta ao apartamento do filho, em Vila Nova Conceição, um bairro agradabilíssimo, comecei a rascunhar esta crônica, prometendo terminá-la tão logo chegasse na Bahia.
Em Salvador, li as últimas páginas de O mundo acabou morrendo de saudade dos tempos do Calcigenol; do Elixir Paregórico; do sapato Vulcabrás; do disco de Vinil; da bomba de Flit; do papel almaço; da goma arábica; dos maiôs Catalina; dos sabonetes Lever e Eucalol; da camisa Volta ao Mundo, e do dropes Dulcora.
Do penico de porcelana, e de outras coisas mais recordadas por Alberto Villas, com inteligência e humor, no seu interessante trabalho.
Oh! O mundo era outro. Esse, sim, acabou.
Pelo menos para este provecto cronista, um sujeito, como sempre, cheio de saudades...