Palavras da moda: pura falácia
Tenho por hábito ler muito. De catálogo telefônico a bula de remédio, leio tudo, de cabo a rabo. Em decorrência dessa minha compulsão, é natural que passe a observar a constante repetição de algumas palavras, pois são usadas à exaustão pelos operadores das letras. Essas palavras tornam-se tão onipresentes quanto aquelas pessoas que estão em todas as festas e em todos os lugares.
Com as pessoas podemos ter um dedo de prosa amiga e alertá-las do perigo iminente desse desgaste ao seu “status” e à sua imagem, enfim. Mas pela própria natureza inerte das palavras, isso se torna impossível. Elas dependem de tutores que as defendam desse risco da exposição excessiva pelo uso desregrado. Talvez por isso aborde este tema, em defesa desses vocábulos que, pelo desmesurado uso, vêm necessitando de aposentadoria. Lembro-me de alguns nessa situação contemplativa, que hoje só andam balangando rede ou de pijamas na frente da TV: “know-how”, “desenvolvimento sustentável” e “altamente”...
Uma palavra quase no ostracismo é o substantivo atitude. A mídia, de uma maneira geral, e os publicitários, em particular, não davam sossego a ela. Em rápida pesquisa, encontrei as seguintes pérolas, como se atitude fosse uma panacéia, ou remédio para todos os males: “estilo é ter atitude”, “ter atitude é fazer escolhas”, “empreender é ter atitude”, “segurança é ter atitude”, “o segredo é ter atitude”, “falta atitude para ter atitude” (este filosofou na maionese, com uma definição círcular...), “ter etiqueta é ter atitude” (boa dica para os novos ricos de plantão).
E, para não ser muito enfadonho, veja, finalmente, o balaio de gatos que aprontaram para demonstrar o significado da palavra: “ser emo é ter atitude” (que é isso?), “ser gótico é ter atitude”, “ser forte é ter atitude”, “ser mulher é ter atitude”, “ser bonita é ter atitude”, “ser competente é ter atitude”, “ser punk é ter atitude”, “ser cool é ter atitude”, “ser grunge é ter atitude” (isso é de comer ou de passar no cabelo?), “ser fashion é ter atitude”. Entendeu, leitor?
Finalmente, uma frase lapidar, que tinha a pretensão de substituir cursos e mais cursos, era a que afirmava, de forma simplista, que “todos são capazes de ser líder: basta ter atitude e querer ser um”.
Atualmente, o que abunda, aqui e alhures, é o adjetivo diferenciado. Como o espaço é pequeno e a paciência do leitor vai-se esgotar – tenho absoluta certeza -, veja apenas alguns exemplos que garimpei em anúncios na mídia impressa: cardápio diferenciado, estudo diferenciado, conteúdo diferenciado, reajuste diferenciado, tratamento diferenciado, corpo diferenciado, apartamento diferenciado, jornal de preço diferenciado, banheiro diferenciado, efeito diferenciado, design diferenciado, brindes diferenciados, churrasco diferenciado, horário diferenciado, anti-estresse diferenciado, atendimento diferenciado, tratamento diferenciado, formatos diferenciados, cartão diferenciado, anúncio diferenciado, casa diferenciada, proposta diferenciada, plantel diferenciado, estilo diferenciado, reajuste diferenciado, linha diferenciada, estofamento diferenciado, arquitetura diferenciada, calçados diferenciados, brechó diferenciado, comportamento diferenciado, visual diferenciado, sucesso diferenciado, produto diferenciado, mostrador diferenciado.
Fico estressado – embora haja antídoto diferenciado para tal, como vimos – com o abuso que se comete com essa palavra, denotando, a meu ver, preguiça mental dos profissionais que a utilizam para vender de anzol a aviões a jato.
Nesse diapasão, diria ser “atitude” “altamente” “diferenciada” usar do meu “know-how” para manter o “desenvolvimento sustentável” dessas crônicas hebdomadárias.
Falácia pura...