Diário de um Diário
Querido xará,
Antes de começar, peço mil desculpas. Sei como você se sente, mas peço, por favor, que me entenda. Preciso desabafar, mas prometo que não tiro muito de seu tempo.
Saí da loja de materiais escolares há 13 anos, e fui parar nas mãos de uma garota linda, que estava começando a aprender a escrever. Tenho muitas páginas, por isso estou com ela até hoje, seguindo seus passos e acompanhando seus momentos mais importantes.
No início, como ela ainda estava começando a escrever, escrevia de tudo, compartilhava os menores detalhes de todos os fatos comigo, porém, enquanto o tempo passava, ela foi me esquecendo. Não tinha mais tempo para mim, tinha amigos com quem podia contar e não precisava mais de minhas velhas páginas desgastadas.
Foi então que percebi que ela passou a me procurar apenas nos momentos ruins, quando se sentia sozinha e abandonada pelos amigos. Recebi notícias de mortes, de términos de namoros, de reprovações escolares, de brigas familiares ou de amigas, ouvi as mais diversas lamúrias, mas me sentia feliz quando percebia que, ao desabafar comigo, ela se sentia melhor.
Porém, querido amigo, hoje minha dona completa 18 anos, está atingindo a maioridade, iniciando sua vida adulta. Estou feliz por ela, vejo que está muito ansiosa para a sua enorme festa que ocorrerá esta noite. Porém, sei que um triste destino me espera depois de hoje.
Sei que amanhã ela não me procurará para escrever os detalhes de sua “super” festa, sei que ela irá arranjar um namorado brevemente e não descreverá suas infinitas qualidades em minhas páginas, sei que ela casará com esse namorado, e não falará sobre seu lindo vestido branco para mim, sei que ela terá filhos, e não falará sobre o quanto eles se parecem com ela em minhas folhas velhas... Tudo isso porque hoje ela virará adulta, e colocaram em sua cabeça que diário é coisa de criança.
Já estou me preparando para passar o resto de meus dias no fundo de uma gaveta velha e empoeirada, esperando o dia em que algum de seus netos tenha sua curiosidade despertada, e resolva ler em minhas frágeis páginas sobre como a vida era, na época em que eu ainda era amado.