Diário B

Às vezes azul, às vezes verde, dizes, no pleno bulício da rua, meu olhar vagueia pelos multicoloridos rostos da multidão, enquanto caminhamos ao bom ritmo de quem, sempre alerta, atravessa a floresta da cidade. Nego moreno branco preto índio negro mulato neguinha pálida tostada rosácea preta na plena maré mestiça incontável. Alta baixa gorda magra loura morena careca cabeluda raspada encaracolada crespa lisa ondulada tradicional ou moderna... gente, impredizivelmente bela. Aqueles olhos africanos amendoados, a altivez na face de quem nada tem a perder, o cadenciado ritmo desses quadris ao caminhar, a bunda* – no altar do macho – destacando, se exibindo, impiedosa, balançando.

O mundo a flor de pele.

Passa ela, e o outro sentado, de palito na boca, ranhando o saco, dá o repasso: de abaixo para cima, para novamente voltar ao centro, com a olhada lambendo, já de língua fora, do pau escorregando a saliva, se babando.

Odeio. Mas tem alguma que gosta, hein! E dá pra paquerar - dizes.

Nojento. Paquerar?

Olhadas pra conquistar. Os olhos nos olhos, quase sempre, como tu dirias, a arte da sedução. Faz-se muito aqui. E lá?

Cada vez menos, e só nos lugares marcados para isso. O medo invadiu a multidão.

Os olhos foram dar ao chão.

* Palavra africana que serve para designar o esporte nacional. Nem futebol, nem samba, o olho a ela é o principal: onde as costas rematam, o lugar de trás ou traseiro, pousadeiras, nádegas, "pompis", ou tantos outros eufemismos barangos. Nada como ela, a melhor: a bunda.

Quinta-feira 24 de outubro, quarta 3, quinta 4 de novembro

Apôs o aniversário, quando a lua enchia.

Nem a gripe pôde com a pele Em B.