PÃO COM OVO

"Quem me dera

Ao menos uma vez

Acreditar por um instante

Em tudo que existe

E acreditar

Que o mundo é perfeito

Que todas as pessoas

São felizes..."

(Renato Russo)

Às cinco e meia da manhã estou pronto para a fumaça do dia, a buzina dos ônibus e os semáforos com diarréia. Corro para o chuveiro, a droga, que era elétrico, pifou e tenho que tomar banho gelado para depois lavar com café quente e amargo minha garganta inflamada coberta de catarro. Meu estômago, já embrulhado com a ressaca do dia anterior – dois litros de vodka com energético e duas belas prostitutas baratas ao meu lado devorando meus ovos com pão, cada uma delas paga com uma nota de dez reais amassada, suja e desbotada no bolso de trás de meu jeans velho e surrado. Enfim, corri para o banho, precisava trabalhar. Mas claro, sempre com um sorriso hipócrita no rosto, afinal, todo cliente quer se sentir um rei, embora ele compre uma mixaria e ainda lhe pague com um cheque sem fundos.

Uma vez, não me lembro quem, mas me disseram: “uma pessoa que se vende, recebe sempre mais do que vale”. Bem, mas hoje em dia, quem não está à venda?...

... O capitalismo é a vitória do poder da prostituição. Para gozar em cima de um salário mínimo, somos obrigados a mentir, sorrir e se fingir de camarada.

Depois do café amargo, Ponho as torradas, descasco o mamão, tomo o leite coalhado e devoro meu pão com os ovos – dessa vez, sem duplo sentido, é pão com ovo mesmo!

Saio de casa e vejo um mendigo sorrir de feliz com sua esmola, passo por um bar e lá está um bêbado com sua cara de alegre escutando o som cafona que lhe emociona, três velhos tocam samba numa praça abandonada, na área de uma casa um casal de idoso dançam um bolero sem som algum, e por fim, o mais hilário: vejo dois cachorros despreocupados cruzando em plena via pública movimenta nem aí para as buzinas dos carros. Enquanto isso, os homens com bons empregos - executivos, médicos, advogados, engenheiros etc. e o escambal - morrem aperreados por culpa de um stress que o malandro despreza...

... A humanidade é tão idiota e paraplégica, que a simples trepada de dois cachorros sarnentos é capaz de interrompê-la...

Vai Henrique Diógenis, manda ver teus versos aí:

REALIDADE

Eu sou um cara feliz,

Não tenho do que reclamar,

Uma vida perfeita e maravilhosa...

Para você que acha a vida um esgoto,

Dela, acho e me acho num arco-íris!

Eu fui, sou e sempre serei um bobo feliz:

Primeiro de abril de eternamente!