CRÔNICA- PROCURA-SE
Certa vez, ainda criança, ouvi uma estória que tinha por personagem uma linda e poderosa fada cujo nome era Felicidade. Aquilo me impressionou profundamente. Será que a tal felicidade se parecia com uma mulher como aquela da estória?
Coincidência ou não, durante muito tempo a felicidade para mim se associou àquela imagem deslumbrante que guardei: uma fada belíssima de cabelos cheios de estrelas e vestido azul-dourado. Naturalmente, não havia nada de errado com ela. Era perfeita.
Belas imagens se vão com o tempo. Mais tarde veio a música que dizia: “felicidade não existe. O que existe são momentos felizes...” Pelas próprias experiências a gente vai aprendendo. Achei que a música tinha mais lógica. Era bem mais convincente que aquela ingênua varinha de condão da minha infância que fazia plim, plim e o mundo ficava cor-de-rosa.
Objeto de estudo, foco de eternas discussões, desde que o mundo é mundo, todo mundo tenta explicar ou descobrir o segredo da felicidade. Afinal o que é ser feliz? Cada um tem uma idéia, mas ninguém tem a receita. Já disseram que a felicidade está em Deus, num grande amor, na paz de espírito, no dinheiro, na realização de um sonho, na família, no trabalho, na saúde, nas coisas mais simples e por aí afora... Quem sabe?
Uma revista, recentemente, fez uma reportagem sobre o assunto pesquisando as idéias dos antigos filósofos. Um programa de TV mostrou que o segredo de ser feliz está na meditação, no esvaziamento da mente. Será que ser feliz é pensar em nada? Possível, mas nada fácil...
Na verdade, parece que a busca constante da felicidade é a grande razão da existência humana. Ao mesmo tempo parece ser também o jogo sempre inacabado de um suspense sem fim: nunca se pode ser feliz completamente. A própria incerteza da vida impede que o estado de felicidade seja permanente. Basta dizer que em menos de um segundo tudo o que nos parece certo e sólido pode cair por chão. São os inevitáveis golpes que nos pegam de repente e parecem se divertir com nosso susto. E disto ninguém está livre.
Tenho mania de ficar analisando as palavras. Gosto de descobrir o que há dentro delas. Outro dia, ao cortar em pedacinhos a palavra “felicidade” percebi: de início ela traz a palavra “fel” que quer dizer algo amargo. No mínimo, irônico: amargura dentro de felicidade.
Por sorte, a palavra “fel” começa com “fe” que ganhando um acento agudo vira “fé”. E fé sugere esperança. Assim, parece lógico pensar que felicidade e esperança andam sempre de braços dados. Ainda bem, porque “a esperança é a última que morre” e a gente querendo, é também a primeira que ressuscita. Do contrário, o que seria de nós sem a possibilidade de um novo momento feliz?
Agora, felizardo mesmo é aquele que desiludido da felicidade plena nem por isso desiste de esperar pelos momentos felizes. Afinal, a vida é cálice de surpresas. Nunca se sabe o que se vai beber dele. Não nos sendo permitido saber que sabor terá nosso próximo trago nada nos resta senão nos prepararmos para prová-lo. Tenha ele o gosto que tiver... Enquanto isso, procura-se a felicidade...