A tecnologia e eu
Datilografia?Cruzes!Eu fiz! Contar denuncia a idade.
Com doze anos as mães logo nos matriculavam em escolas de datilografia, porque ainda não existia a ECA (estatuto da Criança e do Adolescente) e trabalho era algo que começávamos cedo. Na maioria das vezes, nem era pra ajudar no sustento da casa propriamente dito, mas nos mantinha ocupados tempo suficiente para ficar longe das gangues e drogas que sempre existiram e de quebra ainda nos iniciava em alguma profissão.Datilografia era essencial.Ficávamos orgulhosos quando éramos matriculados no curso.Era quase uma identificação.Ter curso de datilografia, era o máximo e se parecia muito com o que vemos hoje com os computadores.
Nossos pais orgulhavam-se em nos ver datilografando a certa velocidade, mas nem todos poderiam ter uma máquina de escrever em casa. Era aí que essas escolas ganhavam, eu acho. Afinal precisávamos praticar sempre. Por falar em máquina, a que eu aprendi datilografar, era do tempo de D.Pedro... Era enorme, pesada o carro imenso e ao terminar um texto, a ponta dos dedos estavam adormecidas de tanta força que tínhamos que empregar nas teclas!Depois elas foram evoluindo, diminuindo o tamanho, tornaram-se mais leves, O datilógrafo geralmente era reconhecido pela mão azul do carbono dos documentos em duas vias... Uma tristeza!
Aliás, naquele tempo só existiam três tipos de jovens. As mãos azuis, os com a cabeça raspada e os filhinhos de papai. As mãos azuis já explicaram. Os cabeças raspadas eram os que a Febem pegava, os desordeiros, pequenos furtos, uso de drogas enfim, os desocupados...Depois das onze da noite na rua?Nem pensar!A menos que se estivesse voltando de algum curso noturno. Essa história de have, rodinha em esquina não era nada bom para a fama dos adolescentes. Ah é, quando a FEBEM os pegava, os cabelos eram raspados afim de evitar a disseminação de piolhos.Vivi em uma época onde corria-se quilômetros de jovens carecas.Hoje, vai saber quem é quem...
Os filhinhos de papai, também faziam datilografia, mas era diferente. Era só para constar no currículo. As famílias que podiam mantinham seus filhos nos estudos até a faculdade, porque faculdade também não era para todos e passar num vestibular exigia dedicação total. Diferente de hoje, que para fazer um curso universitário é só perder a identidade na porta da instituição.
Lembro-me do quanto era cansativo datilografar folhas e folhas de contratos, orçamentos, cartas e rezava para que algo realmente inovador aparecesse. Foi aí que a coisa começou a piorar. Chegaram as máquinas elétricas. Eu já trabalhava e odiava aquilo. Um vacilo, um toque mais intenso e prontoooooooooooooooooooooo!A máquina disparava!Um verdadeiro inferno!Foi aí que inventaram o branquinho eu acho. Um toque no espaço e a infeliz da máquina descia umas dez linhas. Pior. Duas vias ainda se faziam com carbono. Resultado: Trabalhava muito mais... Não conheço ninguém que se acostumava com aquilo e eu, nem era das piores datilógrafas.
Fiquei tão feliz quando o computador se transformou na minha ferramenta de trabalho, que era impossível haver algo de ruim.A torre era imensa e a impressora “Emília” ocupava um bom espaço na minha sala, mas já não tinha as minhas mãos azuis e dava até para notar a unha bem feitinha.
Wordstar, lótus 1,2,3, basic foram os cursos que fiz.Nem sei pra quê...
Hoje a tecnologia avança mais rápido do que o pensamento e fico incomodada por dois motivos específicos: Primeiro porque os avanços tecnológicos são bem maiores que os avanços morais da sociedade, que ao contrário, parecem estar em constante regressão.
Segundo por que. Hoje, o teclado do computador às vezes parece controle de TV que Tem vários botões, várias funções e só usamos mesmo os de mudar canais e volume. Não são as teclas em si, mas o perigo da combinação entre elas que podem custar o trabalho de meses!
Óbvio que é maravilhoso poder contar com o avanço tecnológico em todos os sentidos, mas falemos sério: É muita informação pra quem fez datilografia...