A LÍNGUA DA MODA
O final do ano está aí e com ele as festas de Natal e Réveillon. Está na hora de resolver o dilema do “com que roupa eu vou”, pois mesmo para quem planeja passar as festas entre os familiares, no aconchego do seu lar, o figurino exerce uma grande influência na forma como nos sentimos e vice-versa — A roupa é uma ferramenta de expressão da personalidade.
No momento em que se faz uma escolha, nada arbitrária, a roupa ganha um significado. E é raro uma mulher que se vista mergulhando de olhos fechados no armário, ou cujas roupas que nele guarde sejam escolhidas por outra pessoa. Quando passamos horas, dias ou meses pensando sobre o que vestir numa determinada ocasião, percebemos o papel que a roupa tem na imagem que queremos representar. Verdade esta que cabe também na língua que falamos.
Já reparou nas semelhanças entre a moda e a língua? Ambas são cheias de regras, nuances e versatilidade. Para ambas existe a necessidade de se entender o contexto, a situação de uso e se preparar para tal — ninguém usa os mesmos acessórios de interação (sejam eles roupas ou palavras) quando está em casa, flertando numa balada ou falando numa tribuna. E se o faz, enfrenta problemas.
Existe aquilo que se usa, seja por comodidade, disponibilidade, necessidade de adequação ou forma de expressão da personalidade, e existe aquilo que de tempos em tempos nos é apresentado nas mais diversas vitrines — passarelas, revistas ou acordos ortográficos — como sendo o que está em alta na estação.
É muito mais provável que se assista ao retorno das calças bocas-de-sino e da saia evasê, do que das gírias da mesma época. Por isso, se você as tem guardadas no fundo do baú do saudosismo e gosta de abri-lo esporadicamente, é aconselhável desfazer-se do seu “broto” para dar lugar a mais peças de vestuário retrô, pois estas podem até ser usadas em alguma situação, sem causar alvoroço, já as palavras não. Ou você renova este espaço do baú, ou tranque-o e jogue as chaves fora!
O que a passarela apresenta está para o nosso guarda-roupas assim como o conteúdo dos livros didáticos está para o nosso vocabulário. Existem estilistas e linguistas cujo trabalho busca observar e registrar o que está em uso, vivo nas ruas, nas mais diversas situações de interação social, enquanto outros tentam definir aquilo que é correto e assim ditar o que deve ser usado.
Na prática, é muito mais fácil as pessoas se atualizarem no que diz respeito à moda do que à língua — infelizmente, poucos são aqueles que se preocupam em manter um vocabulário tão vasto quanto o seu guarda-roupas. Quando se trata de seguir as tendências da moda, todo mundo acha bom e, se possível, corre para ser pioneiro em adquirir pelo menos um acessório da coleção da próxima estação. Já quando as novidades são na língua... Bom, nem tanto.
De que adianta um vestido deslumbrante, última moda, uma super produção, se quando a pessoa abre a boca comete todas as gafes possíveis? Na dúvida quanto ao que falar, reza a lenda que ninguém erra ao calar — não erra, mas também não aprende e nem se faz ouvir. Na dúvida quanto ao que vestir, a solução é bem mais fácil: para o dia a dia nada melhor do que jeans e camiseta, para a noite, o bom e velho “pretinho básico” — peças que todo mundo tem, nunca falham e que por sinal estarão em alta no verão de 2010. Pena que a língua não tenha algo equivalente, mas para ela também vale a regra de que “menos é mais”.
Pode até ser mais difícil fazer um upgrade no vocabulário do que no armário, mas nem tanto: em termos financeiros, cada um investe aquilo que pode, e assim como há aqueles que confeccionam as próprias roupas, há quem confeccione sozinho a própria educação. O único preço de ser autodidata é a dedicação. Se por um lado requer um esforço maior, por outro, dura bem mais que uma estação!
*Publicada no Caderno Mulher - Jornal Agora - Rio Grande/RS - Dez/09