ENTREMENTES: (UM INSTANTÂNEO DE MIM)

Sou avessa, por temperamento, a teorias. Aplico-me a elas por uma questão de disciplina, num estágio de reconhecimento do valor das regras que regem todos os fenômenos naturais, científicos, artísticos, humanos...

Por natureza, ando à margem da lógica das coisas e dos homens. Noto a necessidade ditado pelo comportamento humano e acadêmico de nomear, rotular, etiquetar, emoldurar, enquadrar, controlar.

Existe uma força motriz oculta, a nortear os passos que dou. Se vou para a direita, para a esquerda, para a frente, ou para trás, se de repente paro...

Fórmulas, receitas, o ser definitivo sempre me causaram sobressaltos. Talvez, por isso e agora, a minha leitura de teorias, a vida que me possibilita encontros com pessoas de desejos situados no âmbito do estável...

Tange-me certa descoordenação dos loucos, dos marginais e dos visionários.

Nem é preciso dizer que assusto, passo algo como que perigoso, razão do movimento de afastamento daqueles cujo convívio é temporário, circunstancial ou dirigido. Pelo mesmo motivo, os poucos amigos.

Erro, porém, erro não sou. Acerto, tampouco...

Loucos costumam ter um mundo à parte, suas motivações não são logo reconhecidas pela normalidade corrente. Provavelmente está na Arte a maior facilidade de expressão, já que a lógica da realidade exterior não é o seu leitmotiv.

Muito do que apreendo não vem dos livros, estes servem, depois, para referendar e me surpreender com o já mostrado ou percebido intuitivamente.

Paradoxalmente, sou transparente como um cristal. Cristais são sensíveis e delicados. Anuviam-se facilmente. Descobri que a água potável fica muito mais agradável num copo de cristal. Mas a imagem da cumbuca na mão bebendo água da fonte é atávica.

Ou a sofreguidão, buscando-a diretamente com as mãos, o peregrino no extremo da sede, no oásis em pleno deserto.

Viver é estar no limite entre a luz e as trevas, olhar da margem o abismo. A toda hora, um ponto de luz emerge da escuridão, esta, por sua vez, o interruptor a acender o caminho. Reconheço uma Luz Primordial. O espírito precede a matéria. Existir tem sido um aprendizado. Já não me assombram tanto as vicissitudes humanas, já não gastam energicamente o meu tempo.

Contudo, arrepia-me a distância entre o discurso e a prática, tanto dos indivíduos (onde me incluo) quanto das instituições. Este foi o ponto de partida para manter-me eqüidistante das teorias, e a partir da desilusão acadêmica, a lida tem sido aproximar a práxis do pensamento, a filosofia ao fazer com o mínimo de confronto entre a letra e a ação.

Se tem existido bom êxito, não sei; posso dizer em tese que o sofrimento é suportável e a paz dá seus lampejos.

26.11.09 – quinta-feira – dia claro, sol

DIANA GONÇALVES
Enviado por DIANA GONÇALVES em 02/12/2009
Reeditado em 08/12/2012
Código do texto: T1956606
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