O Primeiro Discurso

Primeiro Discurso

Época de festas de aniversários.

Dois dias antes do aniversário que iremos registrar se celebrou o nascimento da estação verão. Dois dias após se celebrará o nascimento do Filho do Pai.

Apesar do verão só ter se iniciado, o carinho materno plasmava-se no suor produzido pelo trabalho prazeroso de cozinhar salgados e doces, de arrumar o apartamento e a mesa redonda da sala de jantar, para aguardar os amigos do primogênito, que viriam para celebrar sua maior idade familiar.

Os pais em questão, somente consideravam os filhos maiores aos vinte e um, sem observar que a maioridade eleitoral é aos dezesseis e a penal, aos dezoito.

Nem bem o sol se deitara, para a lua apresentar-se prateada e luminosa, a energia, o dinamismo e a beleza da juventude transformaram o modesto apartamento, literalmente, numa festa.

Gozações, brincadeiras, risos e abraços eram interrompidos somente para eventuais degustações.

Entretanto, a tradicional e grande interrupção se fez com o convite da “tia”, como aqueles marmanjões continuavam chamando a mãe do aniversariante, para cantar os parabéns.

Encerrado o canto, o coro de é “big”, é hora... e o grito do grupo de escoteiro, ao qual pertencera o protagonista da celebração, alguém puxou um coro acompanhado pela maioria: discursa, discursa...

Todos os presentes, inclusive os pais, conhecedores da timidez e do jeito muito reservado surpreenderam-se com o esfregar nervoso das mãos, esforço bem sucedido para controlar a inibição, e as primeiras palavras, que pareciam invocar clemência: meus amigos...

A surpresa foi tanta que até o tilintar de talheres e copos silenciaram para a continuidade do discurso. Só a ansiedade dos pais e o aroma da festa quebraram aquela expectativa silenciosa.

Quero o entendimento de todos, por não poder satisfazê-los com um senhor discurso. Revelo a todos que faço hoje minha primeira tentativa.

Inoportuno comentário, apesar de jocoso: “e duas desistências” feito por aquele tipo que existe em todo grupo. Tipo que precisa ser notado, seja qual for a situação.

Após risos e algumas exclamações de reprovação, voltou-se à harmonia inicial e a timidez continuou cedendo lugar ao primeiro discurso do aniversariante.

Quero que entendam que não irei expressar-me com aquela melodia e entonação dos políticos, pois tenho a convicção de que assim o fazem, ou por estarem mentindo, ou por não acreditarem no que falam. Além do que, não me agrada a melodia e, quanto ao estilo, acho ridículo.

Agradeço demais a atenção e o carinho de meus pais, não só no dia de hoje, dia que marca o privilégio de estarmos saboreando a vida, mas por todos os dias de minha existência

Em respeito: às acrobacias feitas por meus pais para me proporcionarem atenção, carinho e educação; à solidariedade aprendida com a maioria dos presentes nas atividades escoteiras; e a amizade de todos, assumirei inteiramente a responsabilidade por mim e os seguintes compromissos:

cuidarei de mim cada vez mais e melhor, pois sei que esta é a forma de fazer feliz aos que me cercam;

aprimorarei meus hábitos alimentares, pois aprendi que somos produto do que ingerimos;

desenvolverei minhas relações afetivas de tal forma que o “DOMINAR” , o “SER DOMINADO” nelas não estejam presentes e que o “CUIDAR”, “CONHECER” e o “RESPEITAR” delas sejam alicerces;

respeitarei e aproveitarei cada minuto de minha vida, pois sua duração é fugaz e muito mais efêmera se a relacionarmos ao Universo e à Eternidade;

cuidarei muito bem do corpo, pois o espírito que nele habita exige morada segura, confortável e tranquila;

aprimorarei a paciência e a perseverança, pois entendo que compromissos e objetivos não podem ser atingidos em passes de mágica, ou pela sorte;

finalmente, assumo que a criança, adolescente e jovem que até hoje construíram 21 estarão sempre presentes na mente e no coração deste homem, que acaba de nascer.

Aplausos , vivas e o reconhecimento de todos que, tal como os desafinados, os tímidos e reservados também tem um coração.

J Coelho
Enviado por J Coelho em 30/11/2009
Reeditado em 23/02/2012
Código do texto: T1951842
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