Minha programação para aquele domingo era a seguinte: acordar por volta das dez, me espreguiçar por meia hora, tomar café e ler jornal até as onze, onze e meia, preparar a churrasqueira, temperar a carne, linguiça, asas de frango e o queijo coalho.
Já tinha deixado umas latinhas de cerveja para gelar e não queria nenhuma surpresa. Era só acender a churrasqueira, abrir a primeira latinha e preparar umas rodelas de pão com creme de cebola.
Ocorre que nem sempre as coisas acontecem como a gente planeja , principalmente quando tem cerveja, churrasco e futebol envolvidos.
Eram exatamente oito e meia quando fui despertado por fortes sacudidelas. Era a patroa me acordando e intimando a tomar o café da manhã bem rápido para irmos ao supermercado. Virei para o lado. Talvez fosse um sonho. Quem pensaria em ir ao supermercado num domingo de final de mês?
Percebi que não era um sonho porque as cobertas foram arrancadas com certa impaciência . Sentei-me na cama, fechei os olhos e pensei: “Se eu for rápido ainda dá tempo para fazer meu churrasco !”.
Mas não deu. Primeiro porque a maioria dos carrinhos era conduzida por mulheres e não existe nada mais trágico, mais absurdo, mais catastrófico que uma mulher dirigindo carrinho de supermercado.
Segundo porque tenho pelo menos dez sugestões mais agradáveis do que ir a um supermercado, entre elas acordar tarde e preparar um belo churrasco.
Duas horas depois estava na fila dos caixas para pagamento. Na menor fila, quer dizer, com dez carrinhos cheios a minha frente. Não gosto de esperar, principalmente em fila de supermercado. O bom, o consolo, é que você pode relaxar e cochilar em pé, a não ser que a mulher te cutuque e lembre que teríamos que almoçar mais cedo, porque era o dia do aniversário do nosso afilhado.
Tinha me esquecido, ou melhor dizendo, fiz tudo para esquecer. Sabem quem marca festa de aniversário de criança para domingo à tarde? Esposas que querem se vingar dos maridos e torturá-los! Eram quase treze horas quando cheguei a minha casa. Estava cansado e não era para menos. A primeira coisa que vi foi a bandeja de carne, linguiça e asas que voltaram para a geladeira, ou melhor para o freezer, de onde nunca deveriam ter saído.
O almoço foi realmente rápido. Claro, era só macarrão! E com pouco molho e sem queijo! Triste e conformado, após escovar os dentes fui para o quarto, troquei de roupa e voltei para a sala. Tive um pensamento rápido: “se cochilar e cair em sono profundo talvez ela se compadeça e desista de sair ou então resolva ir sozinha” . Sonhar é bom mas a realidade é outra bem diferente.
Alguns segundos após ter fechado os olhos veio a pergunta, ou melhor, vieram as perguntas, tipo : “Já está pronto ? Já escovou os dentes ? Já tirou o carro da garagem ?” Não respondi. Levantei-me a contra gosto, peguei as chaves e tirei o carro da garagem. Abro um parêntesis para fazer um breve comentário: não é por acaso que os relógios dos homens são diferentes dos das mulheres. É porque elas em determinadas situações se esquecem de que uma hora equivale a sessenta minutos e um minuto a sessenta segundos.
A prova disso é que depois de ter trocado de roupa, escovado os dentes, ter tirado o carro da garagem, ter cochilado (no carro é claro) por pouco mais de meia hora é que ela saiu de casa.
Finalmente estava pronta, com um perfume até gostoso, mas aí estragou o clima quando perguntou se tinha demorado . Saímos. Por sorte o local da festa não era longe, bastava cruzar um viaduto próximo. Chegamos. Foi só desligar o motor para ouvir uma pergunta que me aterrorizou: “-Você trouxe o presente ? “
Abro outro parêntesis para perguntar: "Por que nós homens somos sempre responsabilizados quando as mulheres se esquecem de alguma coisa?"
Não teve jeito, fiz meia-volta e fui buscar o presente. A mulher, de cara amarrada por não tê-la lembrado de se lembrar de trazer o presente do nosso afilhado.
Fomos em casa e voltamos para o salão de festas. Para surpresa da minha mulher (a surpresa foi só dela, pois eu já esperava por isso) fomos os primeiros a chegar. O afilhado ainda não tinha tomado banho e com as mãos sujas de terra abriu o pacote e com a franqueza de uma criança de cinco anos exclamou: “É um caminhão! Mas eu queria uma bola!”
Tem certos "pestinhas" que não conseguem entender que presente é presente. Que garoto mais chato!
O segundo convidado chegou quase quarenta minutos depois e o terceiro após uma hora. A partir daí os outros foram chegando e portanto a festa pôde começar. O bom é que enquanto aguardava pude cochilar um pouco, sentado e de braços cruzados.
Festa de criança é o seguinte: "pestinhas" correndo e gritando como loucos, fazendo uma algazarra danada, mulheres preocupadas com o decote e cabelo das rivais e maridos tomando cerveja morna, curiosos para saber o resultado do futebol e doidos para voltar para casa.
Neste ponto cabe um comentário: nós homens somos desunidos. Em situações como essa era só combinar e iríamos embora ou então melhor, deixaríamos as mulheres e as crianças na festa e iríamos para o bar da esquina tomar cerveja, certamente gelada e assistir nosso futebolzinho pela TV. Como é bom sonhar!
Até que enfim começaram a cantar o "parabéns prá você". Dali a se despedir e correr para casa era um pulo. Talvez desse tempo de ver o finalzinho do jogo.
Pelo menos dessa vez acertei. Corri, não, voei para casa e cheguei a tempo de saber que meu time perdera de 4x0. Só aí notei que na volta minha mulher estivera calada o tempo todo.
“-Que foi ?” - Perguntei meio sem entender o silêncio dela.
“ -Nada. É que a festa estava muito chata. Só tinha fofoca. Antes tivesse ficado em casa.”
Sem saber o que dizer olhei para o relógio e concluí: "Não dá mais tempo de pensar em fazer churrasco."
Naquele domingo, achei melhor ir dormir mais cedo !
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NOTA : eu tinha publicado esta crônica no ano passado mas resolvi retirá-la da minha página. Agora, depois de pequenas correções, resolvi novamente publicá-la .....
(.....imagem google.....)