Cajueiro: meu baobá
Na cultura africana as árvores são sagradas, sobretudo, o baobá, que é considerada uma testemunha da história de vida de uma comunidade e também uma árvore mãe, no qual se aproveita todas as suas partes para a sobrevivência humana.
Meu baobá particular e também do meu povo nordestino é o cajueiro, de origem brasileira que se espalhou pela África e Ásia, no período colonial e atualmente provém dele a única fonte de sobrevivência de muitas famílias nordestinas. Esta árvore pode atingir até 40 metros de altura na região Amazônica, seu fruto é a castanha, e o pseudofruto é o caju, palavra de origem tupi Acaiu, que significa noz que se produz.
Era no tempo das férias escolares, na Fazenda Cauê, cidade de Nova Soure no interior da Bahia, que eu desfrutava do meu baobá individual, aproveitando suas safras, suas flores, frutos, sombras, sucos e o mais importante sua companhia.
Com uns sete a oito anos, já estava de mãos dadas com os galhos. Meu avô fez um balanço, com um pedaço de madeira e duas cordas de sisal, somente por não brotar era um dos mais solitários cajueiros da fazenda, e ficava localizado no lado esquerdo da casa de meus avôs. Ali tive meus momentos mágicos tão intensos que fui ao céu pela primeira vez.
Nessa idade também ajudava a minha vozinha, o trabalho era simples, apenas procurar entre as folhas secas castanhas e cajus, separando um do outro e colocando em um balde. O fruto era a nossa moeda de troca, no qual eu conseguia comprar roupas, brinquedos e o meu material escolar.
Eu escalava nos galhos, quando estava no topo observava Deus por entre as frestas das folhas. Ali sentada escondia-me das pessoas que passavam na estrada, sejam montadas a cavalo ou a pé. Meu sonho era ter uma casa na árvore, que nem a Punk – na levada da Breca. Como não consegui convencer a ninguém para fazer a minha casa na árvore, ficava só imaginando como seria possuir uma, para guardar meu diário, meus sonhos e meus repousos.
Os pseudofrutos com qualidade eram colocados em uma bacia para virar sucos e doces em calda, meu preferido.Todas ás vezes que a minha vozinha ia fazer doce eu ficava ao lado do fogão, observando cada passo, a água escorrendo da torneira e banhando os cajus alaranjados ou amarelos ou avermelhados ia sendo separados das castanhas e indo direto para o caldeirão com açúcar e alguns cravos. E ficava por horas se transformando em uma calda suculenta amarronzada.
Já o suco era menos trabalhoso, ainda não tinha eletricidade na fazenda, portanto, sem liquidificar. Então numa peneira era pressionado o caju para que se desfragmentasse e virasse uma pasta cremosa, no qual acrescentava água e açúcar e estava pronta a bebida.
Uma outra forma de degustar do cajueiro é por meio das castanhas, que ao serem assadas, elas são deliciosas. Minha mãe é viciada em castanhas, ela não pensa em ninguém quando esta em transe pelo efeito provocado pelo sabor da mesma.
O cajueiro faz com que os meus olhos brilhem, sou apaixonada por esta árvore que tão bem me representa, se existir outras vidas, quero nascer um pé de caju, bem grande com galhos tortos que alcancem o céu e assim eu possa namorar as estrelas, e me deliciar com cajus e de castanhas.
Na verdade, acho que quero nascer menina sonhadora novamente e encontrarei um cajueiro que possa ser meu namorado, assim me balançarei nos seus galhos, descansarei nas suas sombras, me alimentarei de castanhas e beberei dos seus lábios os melhores doces e licores.
** Texto produzido no Curso Recortes da Vida (UATU),ministrado pelo Profº Percio.