O Apego

Tanto amor e o que foi mesmo que restou?

Em mim todo o amor, porque a única coisa que foi destruída fui eu (ai que dramático isso). Os laços permanecem aqui, ali, mais acolá e adiante ainda estarão.

As fotos costumavam ficar todas largadas pelos cantos, expostas nas paredes, na porta da geladeira... tudo assim, bem solto e pra todos os lados tentando materializar o que já se decompôs no tempo.

As cartas consegui jogar fora, foi outro dia quando me mudei, e ainda bem que mudei, a janela pixada com nossos nomes a cortina feita ao seu modo, a outra janela em que fizemos amor, ah não têm apego que se desfaça assim. Precisei mudar.

Consegui doar todas as roupas que me deu, sabia? Eu dei. Me senti tão forte com aquilo. Me trancafiei no apartamento todo um fim de semana, chorei bastante, que até senti falta de ar... daí me lembrei de quando eu chorava assim, você me trazia pra contra seu peito e me dizia de seu amor, pra eu ficar calma e tudo passava, e eu consegui respirar, viver e amar ainda mais você.

Você me mata até nas lembranças, não posso viver com você. Você me salva até nas lembranças, aí eu não posso viver sem você.

Hoje eu achei (nunca o perdi, mas fazia de conta que não existia mais) aquela mecha de cabelo sua, que um dia me deu. E disse: - "Se um dia nós nos perdermos um do outro, te deixo fazer até feitiço pra nos resgatar novamente." E eu ri, que achei linda a entrega, mas eu sou cética e você sabe disso.

Eu achei esse cacho tantas vezes desde que estamos assim perdidos um sem o outro... (vai que dá certo?!) mas consegue me imaginar procurando uma Mãe Martha de Obá, um Pai Lucas de Oxóssi, ou indo atrás de um desses caras dos folhetos prometendo amarrações e trazer seu amor de volta em três dias? Ah, não! Não seria amor se não fosse livre. E eu sempre te deixei livre. Ah, e a liberdade dói, quando a escolha te leva pra outra direção. Você é cego, não se sabe se guiar...

Eu pensei em jogar essa mecha de cabelo sua junto com o lixo do banheiro, assim bem simples, mas achei que era uma despedida muito fria pra quem amou de modo tão febril.

Pensei então num daqueles finais de filme bem clichês e o largar pelo vento, deixar que ele sopre pra onde quiser... (bem simbólico isso). E, quando eu estava na janela debruçada sentindo a brisa e tentando me livrar dessa mecha a levei perto do rosto, deixando ela deslizar e me acariciar como um pedaço do que foi... e ela me trouxe o seu cheiro de maneira tão viva.

Eu me perdi de novo dentro de nós.

Dentro desse sentimento.

Eu soube e sei então que eu ainda te amo.

Talvez vá amar sempre. Logo você que tantou pintou e bordou em mim, sobre a minha pele... Logo eu que sou tão cética com respeito ao sentir... Logo nós que já nos desatamos há tanto tempo... Tá amanhã eu tento me livrar dessa mecha outra vez.

Quanto ao amor, nada prometo. Que o vento não pode carregar algo que tem um peso tão grande assim.

Ingrid Fernandes
Enviado por Ingrid Fernandes em 23/11/2009
Código do texto: T1939364
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