A AVENIDA
A noite era quase escura na Avenida que margeava o córrego. As luzes silenciosas dos postes desprendiam-se na sua ingênua castidade a iluminar fracamente sua distância linear e sumir na curva seguinte.
Com a noite, foi-se a visão de seu movimento para dentro das casas, longe das poucas retinas andantes que ainda se aventuram a cruzar suas passagens.
É mais uma noite fria. A avenida chorou gotas de orvalho do inverno no asfalto severo e sentiu os coágulos de luz e frio se jogarem tímidas na sua máscara escura.
O artifício brilhante das lâmpadas era quase nada em seu asfalto sombrio, dando-lhe ares de uma penumbra misteriosa.
Misturou então sua penumbra nas solitárias presenças imprecisas. Misturou penumbra nas carnes que despiam seus desejos flamejantes e se entregavam ao amor afoito no espaço ínfimo de um carro qualquer.
Mas depois da noite veio a madrugada quase a abraçar o alvorecer. A avenida adormecida em suas próprias sombras colheu em seu cálice negro as gotas de orvalho qual vinho sem cor.
Solitária esperou o amanhecer...