A Morena e o Toureiro
A Morena e o Toureiro
O circo havia chegado a nossa cidade.
Não era um circo comum: esse tinha também exibições de toureiros como atração maior. Diante dessa novidade, a minha imaginação de menino voou longe, até os campos da Andaluzia, e já antecipava sangue de toureiro na arena, com o touro bravio fungando e uma bela morena chorando a morte de seu bem-amado, tudo isso me chegando com o colorido do circo de touradas.
Acompanhar a montagem da arena foi uma festa para os meus olhos; toda aquela movimentação, gente diferente, vestida de um jeito que eu nunca havia visto antes, os toureiros com vestes justas e brilhantes. Tudo aquilo era novo em meu mundo, até então tão restrito, resumido aos parcos limites de Gongogi.
A noite de estréia foi um sucesso total. Arquibancadas de madeira lotadas de gente de todos os cantos, touros jovens cedidos pelos fazendeiros locais e uma exibição primorosa dos toureiros.
Vibrei com as fintas que eles faziam com aquele pano vermelho e as calças agarradas nas pernas. O touro passava sempre “lotado”, indo estacar do outro lado da arena.
Um dos toureiros, Vitorino foi o nome que o locutor anunciou com alarde, fazia piruetas inesquecíveis: quando parecia que o touro finalmente conseguiria o seu intento de cravar-lhe os chifres nas ilhargas, ele dava um salto mortal cujo término era o dorso do bicho brabo, para delírio geral da platéia. Algo para nós nunca antes visto.
Vitorino arrebatou os aplausos de todos, e levou também o coração de Marilene, a moça mais bonita de minha cidade.
Uma semana depois o circo foi embora, levando o toureiro Vitorino e sua troupe.
A morena Marilene ficou.
Trazia guardado em seu ventre solteiro a semente do que, talvez, viesse a ser mais tarde, um outro toureiro...
A paixão, por mais que cause estragos, sempre vale a pena ser vivida. Quem nunca viveu uma paixão intensa é como se passasse pela vida sem provar o sabor do açúcar.
Vale do Paraíba, tarde de Sábado, início de Janeiro de 2009
João Bosco