EM BUSCA DE UM

HAPPY END  AMOROSO

  



             Pensara tanto naquele encontro e em todos os detalhes da efeméride-mor de sua cinzenta e aguada vida nos últimos vinte e tantos meses, e agora finalmente parecia que as suas águas iriam mover-se novamente em grande volume e agitação. O co-autor devidamente escolhido, esquadrinhado com indisfarçável esmero, meticulosidade e exigências para garantir um desempenho sem mácula. Mas na afoiteza da busca, conclusões tiradas a partir de algumas conversas no MSN, pequenas dúvidas logo afastadas do foco,( como o fato do dito insistir em comparecer ao evento no dia em que, estando longe a trabalho, teria que dirigir por umas seis horas); seus gostos exóticos por pescarias em locais quase selvagens; muitas fotos em grupos sem a sua presença, fazendo volume e a sua cara por trás de um peixe gigante num sorriso aparentemente jovial e simpático, apesar da feiura visível ainda assim. Aspectos que passavam, nesta romantização providencial, por excentricidades de homem aventureiro, quesito que contou muito em favor dele.
              Estava finalmente aprovado aquele que iria proporcionar o grito de "agora eu dou" ou Morte. Adeus noites de solidão, adeus a infindáveis idas a geladeira em busca de algo para preencher espaços impossíveis, mas enfim, enganando-se com sofrível desempenho, que ja não tinha mais consigo aquela inocência e boa vontade de outrora; muito lhe fora mostrado e por mais que fechasse os olhos, as imagens saltavam diante deles como capetas tentadores tal qual o exame de eletroencefalografia com fatores irritantes pra cansar o cérebro. Aqueles sim, lhe tinham feito imaginar de leve o que seria uma sessão de tortura, pois ao fechar os olhos pra não ver mais umas luzes insuportavelmente irritantes, dava-se conta de que não era por aí... elas continuavam do mesmo jeito.. 
               Assim chegara ao momento crucial estacionando junto ao guarda-roupa do qual voavam vestidos, blusas , calças que iam fazendo uma montanha sobre a cama. Um exercício de aeróbica de arremesso de roupas retiradas do armário e do corpo, e deste, após uma negativa mais ou menos veemente.
               Investida de todos os poderes que uma legislação íntima lhe concedera por muitos votos a zero, abriu a porta de casa e desembocou noite adentro no seu finalmente aprovado vestido de corte reto e colado ao corpo, decote profundo em "V" no branco da seda pura levíssima e acariciante. Não demorou a constatar entretanto a sua completa insensatez e amadorismo, além de cegueira causada por ansiedade temerária, quando o mencionado mancebo, num atraso que a deixara por duas horas um tanto aflita, surge vestido provavelmente com seus mais prosaicos trajes de todo dia. Ela na pressa dos contatos não prestara a devida atenção aos estranhos gostos do rapaz, que por sinal aparecia numa foto segurando um enorme peixe e lhe tinha contado que costumava passar férias nos confins do Mato Grosso aonde ficava a pescar por dias a fio. Estranhas são as pessoas, pensara ela por um instante. Mas ele já se mostrava carinhoso segurando as mãos dela sorrindo como se fossem algum prêmio pela longa viagem feita, ou vai ver ele estava mesmo deslumbrado com tamanha "aventura" (o que ela suspeitou depois ao refletir melhor). E tinha algo de tão desagradável naquela espontaneidade desajeitada e naquela aparência tão decepcionantemente comum, que ela teve vontade de correr.
               Não correu. Se por pena, desânimo, teimosia ou o que fosse, continuou ao lado daquele que ao contrário do que imaginara quando ele lhe dissera que a levaria para um lugar muito especial, terminou por confessar que gastara o dinheiro que tinha à mão na compra de dois peneus. E ela descobriria a seguir que o cartão dele não era lá essas coisas e que tal criatura não tinha o menor senso de direção quando se tratava de encontrar locais razoavelmente à altura daquela que o acompanhava. Felizmente após muito pouco tempo juntos, qualquer cenário para o sonhado desenlace foi energicamente descartado e uma salada pra ela e muita comida pra ele que estava faminto, foi o único acontecimento daquela noite, sendo a conta paga por ela que o fez com estranha e maléfica alegria: não ficaria devendo nada àquele que nunca devia ter conhecido.
tania orsi vargas
Enviado por tania orsi vargas em 17/11/2009
Reeditado em 24/02/2010
Código do texto: T1928656
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