Crônica de um Recém-Formado II: no Sul do País

Nossa, que sono! Já é tarde, mais de 8 horas e eu ainda aqui, nessa cama. Mas tá tão quentinha... Pelo menos lá fora o Sol tá brilhando. Deixa eu levantar logo, senão eu acabando perdendo a aula do curso. Já vou chegar atrasado mesmo. Brrrrr, que frio. Sinto saudades da Bahia, mas nessas horas, vixe Maria, dá mais saudade ainda! Tomar banho nesse frio é um ato de heroísmo! Brrrrr, dddeixa, eeeu lligggar lloogggo o chhuuvveiro nno quueennte! Pronto, chuveiro ligado, tudo beleza. Agora sim. Coisa vai ser depois que eu terminar o banho.

Vamos nessa. Continuo andando de ônibus. Não estou mais morando em Salvador. Agora em Curitiba, Paraná, Sul do País, curtindo um friozinho (olha a intimidade!). Os ônibus aqui são diferentes, bem melhores do que na capital baiana, minha terra natal, apesar de eu ter adotado como cidade do coração Feira de Santana, cidade onde eu... peraí... não é biografia. Desculpe! Retomando a história, peguei o bus e fui em direção ao centro. Tudo ok, tudo certo. Vi um outdoor bonito, com o rosto da Ivete Sangalo, falando “Quer andar de carro novo? Vambora!”. “Agora não vai dar Ivete! Tô liso”, respondi mentalmente pra ela, minha conterrânea de baianidade.

Cheguei no curso. É daqueles cursos telepresenciais, sabe. É bom, vale a pena. Mas aqui não é propaganda do curso. Quando eu me deparei com a seleção de professores (sim, porque aquilo não é uma mera equipe, é uma verdadeira seleção), a maioria baianos. Putz, pensei comigo, que chato ser baiano. Venho pra cá e, para minha surpresa, os juristas baianos estão dando show. Hehehe. Já tinha visto Ivete (tudo bem que foi num outdoor, mas também eu não estou na Bahia), ia ter aula com professor baiano, puxa vida, “tô em casa”, falei pra mim mesmo. Falei mesmo, não falei só em pensamento, não. Quando a gente passa a ficar muito tempo com a gente mesmo, começa a fazer isso, a conversar, em voz alta, com si próprio.

Como a aula dura mais de 3 horas, geralmente por volta das 9h30min tem um intervalo. Durante esse intervalo, pra não ficar na sala aquela tela enorme vazia (parecendo sessão de cinema que não começou ainda), fica rolando uma música. Nesse dia, depois de Ivete (com aquela ressalva do outdoor) e do professor baiano, quase que eu não acreditava na música que estava ouvindo. Era o Harmonia do Samba, numa verdadeira ode à Bahia. Não me contive. Tudo conspirando em favor da minha baianidade. Tinha uma colega ao lado, esperando também terminar o intervalo para recomeçar a aula. Não pensei duas vezes. Estufei o peito, dei um sorriso (aquele, com ar de superioridade, você sabe. Sim, esse mesmo!) e, com o braço sobre o encosto da cadeira ao meu lado, olhei pra ela e disparei: “É... tocando pagode. E pagode da Bahia!”. Pronto. Fulminei. “A Bahia tá em todas, somos demais”, pensei. Ao que ela respondeu: “Pois é... tem dia que é pior. Tem dia que eles tocam funk”.

Danilo Andreato
Enviado por Danilo Andreato em 19/01/2005
Código do texto: T1926