ISTO É INCLUSÃO ESCOLAR? ( “O direito de todos estarem juntos não é maior que o direito individual ao desenvolvimento”, apontou o MEC, em 2020)
O sino tocou, anunciando o início de mais um dia na escola onde leciono há anos. Entre tantos alunos, havia um que se destacava, não por suas conquistas, mas pelo caos que semeava. Ele era incluído no sistema por ser portador de baixa audição, mas, ironicamente, era o mais indisciplinado de todos. Esse aluno já havia sido ameaçado de expulsão várias vezes, mas isso nunca se concretizou devido à proteção oferecida pelo projeto inclusivo.
Ele quebrava vidros, derrubava mesas e carteiras, maltratava colegas, gritava, entrava e saía da sala à vontade e nunca fazia as atividades propostas. O mais intrigante era que, mesmo com esse comportamento, ele tinha seguidores. Outros alunos, ditos normais, inspiravam-se nas suas ações e o imitavam. Trocaram-no de sala, mas não adiantou. Havia até quem dissesse que ele cuspia na bandeja de lanche dos outros.
No entanto, seu boletim ostentava notas seis em todas as matérias, em todos os bimestres. "Estava sempre na média". Na verdade, estávamos reféns dele, nivelados por ele. Não podíamos reprová-lo. O nível da classe era puxado para baixo.
A tal socialização, defendida por muitos psicopedagogos, parecia ser a única justificativa para manter esse tipo de aluno na comunidade escolar. Ele não acompanhava o ritmo dos regulares e, muitas vezes, não ensinava nada de bom. Em uma ocasião, incentivei-o a escolher um grupo para um trabalho de nota do quarto bimestre. Infelizmente, ele escolheu seus "discípulos". Ele apenas assinou o trabalho pronto e, claro, o resultado foi péssimo, recebendo uma nota quatro.
Como eu poderia explicar isso ao resto do grupo, se o aluno "especial" tinha que ficar com seis? Seria justo dar a mesma nota a todos por extensão da misericórdia atribuída a ele? Que critério eu poderia aplicar para incluí-lo notoriamente na baixa qualidade apresentada, sem sofrer penalidades, discriminação ou escárnio de colegas e superiores?
O mais cômico — ou trágico — foi quando ele descobriu sua nota quatro. Foi imediatamente à sala dos professores e, entre gritos e baixarias, dirigiu-me os piores palavrões e ameaças. Com o dedo em riste no meu nariz, ele vociferou: "Eu não posso tirar menos que a média, eu sou doente! Consertem minha nota ou vou te denunciar, seu professor de merda!"
Ele não tinha a capacidade dos outros, mas se aproveitava da condição de "especial" para se beneficiar. A inclusão, nesse caso, parecia mais uma desculpa para justificar o injustificável. A autoestima do aluno pela socialização não compensava o prejuízo semântico da palavra "especial". Uma discriminação não vale a outra.
Sem um professor de apoio, a situação era insustentável. E os colegas de classe? Ninguém os consultava sobre como se sentiam. A inclusão escolar parecia uma competição desleal, onde, em vez de um superar o outro, todos se nivelavam por baixo. Ao ler sobre estratégias educacionais, eu me condenei por compartilhar minha experiência. Mas, por um momento, culpei quem insistia em que todos somos iguais.
Até que alguém me explique convincente e claramente que tipo de inclusão é essa, continuarei afirmando: "De tanto passarem a mão na cabeça do deficiente, esquecem-se de formar o seu caráter social". E na escola, temos que suportar outros "pseudoinclusos". Assim, o meu trabalho se torna deficiente, diluído e sem qualidade. Já não sei mais quem precisa de inclusão. Carrego a deficiência que mutila a aprendizagem da maioria. Inclua-me fora disso! Quero ser um ser social e não imposto. Pelo amor de Deus, tire-me dessa inclusão!
Como Valdeci Santos sabiamente disse: "Todas as deficiências são aceitáveis e passíveis de inclusão social, menos a do caráter". Por isso, salvo exceções, insisto: a inclusão precisa ser repensada para verdadeiramente beneficiar a todos.
Enquanto observo o pátio da escola pela janela, vejo o aluno rindo com seus amigos. Por um momento, vislumbro o potencial escondido por trás da rebeldia. Talvez, penso eu, a verdadeira inclusão comece quando conseguirmos enxergar além dos rótulos, quando pudermos exigir o melhor de cada um, independentemente de suas limitações.
O sino toca novamente. É hora de voltar à sala de aula. Respiro fundo, reunindo forças para mais um dia. Porque, apesar de tudo, ainda acredito que podemos fazer melhor. Que podemos construir uma escola verdadeiramente inclusiva, onde cada aluno, cada professor, cada funcionário se sinta valorizado e desafiado a crescer.
E quem sabe, um dia, quando o sino tocar, ele anunciará o início de uma nova era na educação. Uma era de inclusão real, de respeito mútuo e de crescimento coletivo. Até lá, continuo minha jornada, um dia de cada vez, na esperança de fazer a diferença, mesmo que seja para um único aluno.
Questões Discursivas:
1. A inclusão como ferramenta de nivelamento por baixo ou como potencial para o desenvolvimento individual e social?
Discuta criticamente a partir do texto a relação entre a inclusão escolar de alunos com deficiência e o nivelamento da qualidade do ensino para baixo. Analise os argumentos do autor a favor e contra essa perspectiva, considerando os desafios e as oportunidades que a inclusão apresenta para o aprendizado de todos os alunos.
2. Entre a falsa inclusão e a verdadeira inclusão: qual o papel da escola e da sociedade na construção de uma educação de qualidade para todos?
Com base no relato do professor, explore os desafios da inclusão escolar quando atrelada à falsa ideia de igualdade e à falta de suporte adequado. Discuta as medidas necessárias para construir uma escola verdadeiramente inclusiva, que promova o desenvolvimento individual e social de todos os alunos, valorizando as diferenças e potencializando as habilidades de cada um.