A Hostilizada da Uniban - Mais uma loira na TV, oba!
Antes que parem a leitura pelo terceiro parágrafo, deixo claro que: A hostilizada não é puta, e também não é santa (Nem Pagu, nem mesmo a da Rita Lee). É humana, tanto quanto todos nós, em seus desejos e instintos. A loira da Uniban não é melhor (e tampouco pior) que seus colegas de faculdade: é igualzinha. Mas não pensem, leitores, que estou sendo machista. Também não serei feminista. A hostilizada não foi à faculdade de minissaia com a mente feminista e politizada, ela foi à faculdade com a mente justamente machista, de ser um símbolo não de liberdade, mas de adequação aos valores masculinos de desejo sexual. E foi hostilizada por homens e mulheres, que também foram machistas.
Faculdade não é lugar de hostilização, de externar instintos primitivos, mas também não é lugar de querer aparecer. Não vou aqui defender a estudante, ela não fez nada de nobre para ser defendido. No Brasil é comum confundir quem foi vítima de um exagero, de uma humilhação com herói. Ou oito ou oitenta. Ou você é machista ou feminista, ou está do lado da hostilizada ou dos hostilizantes. Mas não há heróis e bandidos aqui, não existe esse maniqueísmo. A realidade é complexa. Aquilo foi um laboratório do que é o ser humano, principalmente no depois, na audiência que foi dada e ainda é dada à estudante, tornando-a oposto do que foi xingada. Agora de puta virou santa, de vulgar virou nobre. Ela não é nem uma coisa nem outra, é humana, tem seus desejos, suas carências e suas espertezas, e soube aproveitar a situação para dar sua volta por cima. Aí sim, de anônima virou celebridade. Sua sensualidade rejeitada agora é um sucesso.
E como sempre, no Brasil, está se fazendo mais sucesso sendo um símbolo sexual do que tendo um diploma de faculdade. De fato, duvido que a universitária faria tanto sucesso na vida sendo turismóloga do que nessas semanas de exposição na mídia. A mulher é manchete quase que diária dos sites jornalísticos do país, já deu entrevista em quase todas as emissoras. Daqui a pouco a revista Contigo vai estar publicando “A dieta da hostilizada”, a Paparazzo vai publicar “As poses sensuais da hostilizada”, a Veja vai fazer uma exclusiva com a hostilizada. A hostilizada vai fazer ponta na Turma do Didi, vai aparecer no Domingo Legal, e só falta ela interpretar um funk para decolar na carreira musical. Sério, gente, precisava idolatrar a universitária para compensar sua humilhação? Claro que sim! Era tudo que ela queria! Aparecer! E conseguiu! Mas discutir a educação no país e o nível de nossos universitários e graduados, nada! O foco é só um: Ibope com a sexualidade.
No Brasil temos faculdades que não formam cientistas, só dão diplomas para quem pague as mensalidades, e os formandos incorporam esta ideologia de canudo-prêmio, como se estivessem ganhando uma chave de carro novo do papai; A educação no país é péssima, o que faz com que os universitários venham de um Ensino Médio que não lhes ensinou nada de ética, respeito, tolerância, cidadania; E, por fim, temos uma mídia que intensifica essa polemização de ocorrências cotidianas que, no fundo, não têm a menor importância, mas a mídia precisa de assunto, precisa de ibope, precisa das hostilizadas, que, por sua vez, se aproveitam da mídia como trampolim de suas carreiras, ou de uma breve fama, pois pelo menos, como já disse, será uma fama maior do que talvez ela tivesse em toda sua vida como simplesmente mais uma diplomada.
O brasileiro consumidor dessa mídia, por sua vez, parece gostar de dar ibope e voltar sua atenção para qualquer caso que seja exposto como polêmico, pois parece gostar de ser fã de tudo que chama a atenção, quer participar do clube, quer ter sua parcela diária de entretenimento, enquanto as notícias que deveriam ser relevantes para nós discutirmos, como por exemplo a política, a falta de educação cidadã no país, a falta de civilidade dos jovens universitários são simplesmente ignoradas. Outro dia eu estava lendo o argentino El Clarin on line, e me surpreendi com uma matéria jornalística sobre a intervenção do governo brasileiro em Honduras. A matéria trazia uma biografia da diplomacia brasileira no exterior, passando por Getúlio Vargas até chegar ao governo Lula e sua postura na construção de uma unidade sulamericana, e agora, em Honduras, centroamericana, interferindo na zona de influência estadunidense, disputando seu espaço de influência política com os Estados Unidos em uma divisão de zonas de influência no continente americano. Simplesmente brilhante! Mas o que me deixa pasmo é saber que um argentino está sabendo mais da história do Brasil do que o próprio brasileiro. Nossas matérias jornalísticas, até mesmo no site da maior mídia do Brasil, beiram ao tosco! Reportagens com pouco conteúdo, sem contextualização histórica, feitas praticamente de recortes de pequenas manchetes. Um lixo cultural.
Já escrevi outras vezes e repito: Enquanto ser brasileiro for ter mais chances de sucesso sendo um símbolo sexual do que portando um diploma universitário continuaremos a formar jovens embrutecidos e intolerantes, que queimam mendigos e índios, espancam prostitutas e quem com elas se pareça, e que acham que a raça pura é uma boa ideia. Enquanto tivermos um sistema de ensino que, além de formar alunos que mal sabem ler ou fazer conta, formam alunos que não aprenderam o que é cidadania ou senso de responsabilidade pública ou crítica social continuaremos a eleger, como bestas analfabetas, representantes políticos irresponsáveis e danosos ao interesse público, que, por sua vez, comandam o sistema educacional, prisional, a segurança pública, a saúde pública. Pois é, conseguimos dispor nossa atenção para casos de vestidos rosas, mas não temos o menor interesse em discutir nossos tabus, mas não os tabus sexuais não, os tabus políticos, os tabus que fazem de nós um dos maiores países do mundo, mas com um povinho tão descivilizado...
Por fim, de tudo o que eu acho que dá assunto para discutir sobre o episódio na Uniban (e aqui mesmo no Recanto podem-se encontrar críticas excelentes sobre o assunto), acredito que uma das maiores polêmicas está fora do assunto, a polêmica está em nós, consumidores de polêmica, e a polêmica é encarar que nós brasileiros damos demasiada importância em assuntos realmente idiotas e somos demasiado idiotas em assuntos realmente importantes.