Um longo beijo
Pensava o que era mais macio e cedia mais, se teu corpo contra as grades do prédio ou meu corpo contra o teu.
Chovia. Muito. O vento ainda nos espirrava água na diagonal e redemoinhava sujidades antes deitadas no meio-fio. O céu em queda livre e abrupta sobre nossas cabeças. Era estreita a marquise.
E nos amassávamos os corpos, fundindo-os quase em um na fuga à chuva cada vez mais fria daquele fim de tarde já noitinha.
Teus lábios tão molhados quanto os meus sem nada a ver com a chuva, com o vento, com qualquer circunstância a não ser com nosso beijo. Longo beijo. Profundo, comprido como a espera pelo ônibus.
Quando veio, mais uma vez estava muito cheio.
Lotado.
Sem alternativa, paramos o beijo e o ônibus e nos enfiamos entre uma centena de almas e mochilas nos corredores suarentos de
odores vários, até de gozos.
Fomos, finalmente.
Muita água, muita gente, muitos apelos.
Do que qualquer um outro era mais macio, cheiroso e gostoso o teu corpo.