Dificilmente se encontrarão alguém do judiciário com tanto circunspecção coeso, lacônico e intelectivo quanto o Ministro Celso de Mello! O paulista de Tatuí já acumula no currículo o título inclusive de ter sido o mais jovem Presidente do STF aos 51 anos. Celso de Mello que veio da carreira do Ministério Público já acumula 20 anos de STF com decisões alinhadas e probas.
 
Esta semana o Ministro Celso de Mello decidiu o embate entre Ricardo Teixeira, Presidente Eterno da CBF e o jornalista e comentarista esportivo Juca Kfouri, após 10 anos de disputa no judiciário, um que pediu indenização por danos morais em detrimento de um comentário jornalístico do outro.
 
A notícia é do CONJUR, do jornalista Maurício Cardoso. Em 7 de dezembro de 1999, Kfouri publicou em sua coluna no jornal Lance nota comentando entrevista concedida pelo presidente da CBF ao jornalista Carlos Maranhão e publicada na revista Playboy. Dizia a nota: “O jornalista Carlos Maranhão fez quase todas as perguntas que devia ao presidente da CBF na entrevista da Playboy deste mês. E, como sempre, o cartola respondeu sem nenhuma preocupação com a ética ou com a verdade. Merece ser lida, até porque os destaques na edição da entrevista são suficientemente maliciosos para bons entendedores. Aliás, você só acredita se quiser. E tem um furo: Ricardo Teixeira ganha, de salário, R$ 17 mil na CBF. É pouco.”.
 
Teixeira entrou, então, na Justiça com ação de indenização por danos morais contra o autor da nota. Em primeira instância, o pedido de indenização foi negado pela juíza da 8ª Vara Cível do Rio de Janeiro, Maria da Glória Oliveira Bandeira de Mello. Teixeira recorreu. A juíza entendeu que “o fato de declarar não estar o autor preocupado com a ética ou com a verdade não significa, necessariamente, imputar-lhe as qualidades acima mencionadas. Ademais, eventual falta de ética ou da verdade tem sido matéria amplamente divulgada em todos os anais, mormente diante da instauração da CPI do futebol, fato público e notório”. Para a juíza, o fato de dizer que R$ 17 mil era pouco “não está atrelado à conclusão de que estaria o autor se locupletando ilicitamente”.
 
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro deu razão para Teixeira por entender que “quem, a pretexto de noticiar e criticar, assaca injúrias, é obrigado a indenizar”. Diz a ementa do acórdão: “A liberdade de imprensa deve, sempre, vir junto com a responsabilidade da imprensa, de molde a que, em contrapartida ao poder-dever de informar, exista a obrigação de divulgar a verdade, mesmo que com críticas feitas pelo jornalista à conduta da pessoa abrangida pela notícia, mas sempre preservando a honra alheia, ainda que subjetiva”.
 
Entra em cena a figura do STF! Com duas etapas queimadas; primeira instância dando razão ao jornalista e a segunda instância, ambas no Rio de Janeiro, dando razão a Teixeira, restou à apelação máxima e o relator foi o Ministro Celso de Mello. Experiente e profundo conhecedor do direito, não teve dúvida na hora de seu despacho.
 
Para o ministro Celso de Mello, do STF, a questão em julgamento é justamente o exercício do direito de informação e do direito de crítica pela imprensa. Celso de Mello entendeu que, no caso da nota publicada por Juca Kfouri, “longe de evidenciar prática ilícita contra a honra subjetiva do suposto ofendido, traduz, na realidade, o exercício concreto, por esse profissional da imprensa, da liberdade de expressão, cujo fundamento reside no próprio texto da Constituição da República, que assegura, ao jornalista, o direito de expender crítica, ainda que desfavorável e mesmo que em tom contundente, contra quaisquer pessoas ou autoridades”.
 
Celso de Mello faz uma defesa veemente do direito que tem a imprensa de criticar, principalmente as autoridades e homens públicos: “Ninguém ignora que, no contexto de uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão estatal ao pensamento, ainda mais quando a crítica — por mais dura que seja — revele-se inspirada pelo interesse coletivo e decorra da prática legítima, como sucede na espécie, de uma liberdade pública de extração eminentemente constitucional".
 
O ministro sustenta que a liberdade de imprensa compreende as prerrogativas do direito de informar, buscar a informação, opinar e criticar. “A crítica jornalística, desse modo, traduz direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer atividade de interesse da coletividade em geral, pois o interesse social, que legitima o direito de criticar, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar as pessoas públicas”, diz.
 
O direito de crítica atinge especialmente pessoas que ocupam posições públicas e prevalece sobre o seu direito à personalidade. “É por tal razão que a crítica que os meios de comunicação social dirigem às pessoas públicas, por mais acerba, dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos da personalidade.”
 
Celso de Mello afirma ainda que o direito de crítica se fundamenta no pluralismo político e que não cabe ao Estado impor-lhe limites e que nem mesmo o Judiciário tem poderes para cercear a livre manifestação do pensamento pela imprensa. “É preciso advertir, bem por isso, notadamente quando se busca promover, como no caso, a repressão à crítica jornalística, mediante condenação judicial ao pagamento de indenização civil, que o Estado — inclusive o Judiciário — não dispõe de poder algum sobre a palavra, sobre as idéias e sobre as convicções manifestadas pelos profissionais dos meios de comunicação social.”
 
E conclui: “Nenhuma autoridade, mesmo a autoridade judiciária, pode prescrever o que será ortodoxo em política, ou em outras questões que envolvam temas de natureza filosófica, ideológica ou confessional, nem estabelecer padrões de conduta cuja observância implique restrição aos meios de divulgação do pensamento”.
 
É fato que haja críticas infundadas, mentiras desordenadas que só atrapalham a vida de pessoas e empresas; isso sim deve ser combatido e que bom se um dia o fosse com prisão daqueles que inventam fatos. Quem se presta ao papel de inventar fatos em veículos jornalísticos merece não só o esquecimento, mas também a punição rigorosa pela prática nefasta.
 
O que se tem observado no Brasil é que a justiça tem sido utilizada por pessoas e empresas como arma de coação a quem critica ou quem fala a verdade abertamente; jornalistas, articulistas e até veículos de imprensa estão sendo chamada a justiça para explicarem o porquê das veiculações que são meras verdades; isso sim deveria ser crime.
 
Falar a verdade dói muito naquele que é o alvo da verdade; no Brasil, esta pessoa ou empresa, quando se vê diante da berlinda e diante da crítica pública, normalmente se incube de promover uma ação de reparação, ação esta infundada, até mesmo como forma de mostrar seu poderio econômico e seu pseudo destaque social.
 
Também é fato de que estas pessoas se revelam na peças vestibulares que entopem os fóruns, afirmando que geram empregos, que possuem títulos, que são detentoras de diplomas ou que possuem caráter irretorquível, como se isso tudo fosse mais relevante do que a própria Constituição Federal e as deixassem livres de críticas e reparações judiciais.
 
É indiscutível que quem tem dinheiro e poder jamais aceite a crítica; seja Ricardo Teixeira, o Presidente Lula, José Sarney ou o hotel que se diz de luxo e que recebe personalidades como Julio Iglesias; ninguém aceita ser criticado publicamente, porque isso, na cabeça deles, não é e não será jamais um instrumento de melhoria de seus atos ou serviços; eles estão agindo de forma equivocada e ponto; você tem que aceitar e caso veja algo irregular, jamais pode criticar ou dizer a verdade em público; das duas uma: ou são massacrados na justiça ou temem pela própria vida.
 
Graças a Deus ainda existem juízes, sejam do interior ou das grandes cidades, que não aceitam estas teses medíocres, descabidas e limitadas; ainda bem que a mente dos novos desembargadores estão abertas a uma realidade que não seja aquele modelo paternalista que sempre vimos ser aplicado; Graças a Deus ainda temos gente séria nos tribunais superiores, que mesmo após divergirem no pleno ou nas câmaras, proferem sentenças brilhantes; sentenças estas que ainda nos fazem acreditar num Brasil menos “Braziu”.
 
Xô analfabetos jurídicos! Xô satanás! Como dizia a música do grupo Asa de Águia!
 
 
Carlos Henrique Mascarenhas Pires
www.irregular.com.br
 
Quem quiser ler o despacho completo de Celso de Mello, basta acessar a página do STF e digitar o AI505.595 na busca; é público, é brilhante e merece ser lido por todos, principalmente pelos advogados catecúmenos.
 
Foto: Folha de São Paulo
CHaMP Brasil
Enviado por CHaMP Brasil em 12/11/2009
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