Santo de casa
 
Águida Hettwer
 
 
 Por mais que torneamos as palavras, às vezes elas não se moldam. Transformam-se em rimas tortas, sílabas ácidas, difíceis de contornar. A indiferença é educada, coloca pontos e vírgulas. Restringem-se ao pouco, ao quase nada, as migalhas e sobras de afeições.
  
 Quanto maior o nó de afeto, mais difícil de desenrolar. A intimidade nos une e nos afasta daqueles que amamos. Muitas vezes os esforços a alheios não são medidos em fita métrica, mas aqueles que nos são íntimos, os favores são recusados com naturalidade. Até parece, que a rotina, anula a conquista. Cessa as delicadezas.
 
 As relações tomam rumo da frieza, ou o oposto. Para se manter “vivas”, bajula-se até o ultimo fio de cabelo. Como mercadores da morte, passamos a viver o gosto do outro, os caprichos, os destemperos. Numa falsa desconcertante tentativa de fazer o outro feliz.
 
 O tempo nos permite perceber claramente, que “santo de casa” não faz milagres. Os defeitos estão naqueles que temos intimidades, a capacidade e perfeição dos atos, perpetuam aqueles que nos são desconhecidos. 
  
 Onde não há intimidade. Não revelamos o que realmente somos. Nas relações transparentes há tempo, para contendas, ofensas, arrependimentos e perdão. No amor somos “esparramados”, santos de auréolas. Quem nunca por amor, excedeu em proteção.
 
 Partiu para conselhos furados, deu com os “burros n´água”. Mas continua através dos erros, a tentativa de acertar pelo menos uma vez na vida.
 Na complexidade do amor, somos pequenos cristais frágeis. Moldando-nos nas esferas do tempo.
 
 
 
11.11.2009