Eu cursava a quarta série, era essa época. Lembro disso por causa daquelas carteiras antigas de ferro e madeira, cujo encosto do colega da frente se prolongava sendo o apoio da carteira e o assento abaixava e levantava. Algum tempo depois trocaram por aquelas mesas e cadeiras de fórmica verde, não mais em conjunto como as anteriores, mas separada.
Fazíamos tarefa de classe, alguma coisa que a professora tinha passado na lousa, enquanto ela, sentada à sua mesa, passava a limpo os livros de ponto, ou cadernetas, não lembro mais como se chamavam.
Obviamente que todos os alunos estavam em silêncio, fazendo sua tarefa. E eu, um aluno interessado, aplicado e comportado, não fazia outra coisa senão concentrar-me naquela lição.
De repente, algo desviou a minha atenção. Um colega da minha fileira, sentado duas ou três carteiras atrás de mim, começou displicentemente a assoviar uma melodia, bem baixinho: FI FI FIU FIU FIFI FI FIUUU... Assoviava em pequenos intervalos, sem parar, essa repetição. Não era um assoviar muito alto, mas dava para ouvir.
Eu, ouvindo aquele assovio, me dei conta de uma deficiência de minha parte: eu não sabia assoviar. Claro que eu sabia como se fazia. Punha-se a língua nos dentes inferiores, fazia-se biquinho com os lábios e fazia passar o ar por esse conjunto assim formado. Isso eu sabia ou por dedução ou por observação. Só não sabia mesmo é tirar som desse instrumento natural.
Ouvindo o colega assoviar lá atrás tão facilmente, achei que já era hora de eu mesmo aprender uma coisa assim tão simples e resolvi tentar, mas o som não saía de jeito nenhum. O que saía era apenas o ruído do ar: FUFU FUU FU FU FUFU FUUUUUU FU! E se ele parava, eu também parava. Ele recomeçava e lá ia eu tentar de novo, mas ainda sem conseguir emitir som algum.
Assim foi até que a professora ouviu e percorreu a sala com os olhos, a fim de encontrar o aluno canoro, que em vez de fazer sua lição, entregava-se ao prazer e ao disparate de atrapalhar a concentração de todos.
E é claro que ela encontrou logo o autor de tamanha façanha musical, ou melhor, o suposto autor. Eu sentava na segunda carteira, ela me viu então com o bico a postos, dedicado por demais ao deleite de assoviar. Quer dizer, ela me viu assim e ouviu o som, sem perceber o involuntário ventriloquismo da situação.
Contrariada com tamanha audácia, pelo menos ela pensava isso, levantou-se de sua mesa armada com a sua famigerada régua de madeira de trinta centímetros, que era grossa, e aproximou-se de mim sem que eu a percebesse, ali supostamente assoviando alegremente e, também supostamente, pouco me importando com a sua presença e com os meus afazeres de classe.
Furiosa, deu-me com a dita régua na cabeça, mas não de lado e sim de quina, o que, além de me assustar, doeu demais. Com a dor e o susto eu, ali provido de meu eficiente aparelho sibilante, em vez de gritar, distraído que estava, soltei enfim o meu primeiro e sonoro assovio: FIFIFIIIIIIFIUUUUUUUUUUU...
Fazíamos tarefa de classe, alguma coisa que a professora tinha passado na lousa, enquanto ela, sentada à sua mesa, passava a limpo os livros de ponto, ou cadernetas, não lembro mais como se chamavam.
Obviamente que todos os alunos estavam em silêncio, fazendo sua tarefa. E eu, um aluno interessado, aplicado e comportado, não fazia outra coisa senão concentrar-me naquela lição.
De repente, algo desviou a minha atenção. Um colega da minha fileira, sentado duas ou três carteiras atrás de mim, começou displicentemente a assoviar uma melodia, bem baixinho: FI FI FIU FIU FIFI FI FIUUU... Assoviava em pequenos intervalos, sem parar, essa repetição. Não era um assoviar muito alto, mas dava para ouvir.
Eu, ouvindo aquele assovio, me dei conta de uma deficiência de minha parte: eu não sabia assoviar. Claro que eu sabia como se fazia. Punha-se a língua nos dentes inferiores, fazia-se biquinho com os lábios e fazia passar o ar por esse conjunto assim formado. Isso eu sabia ou por dedução ou por observação. Só não sabia mesmo é tirar som desse instrumento natural.
Ouvindo o colega assoviar lá atrás tão facilmente, achei que já era hora de eu mesmo aprender uma coisa assim tão simples e resolvi tentar, mas o som não saía de jeito nenhum. O que saía era apenas o ruído do ar: FUFU FUU FU FU FUFU FUUUUUU FU! E se ele parava, eu também parava. Ele recomeçava e lá ia eu tentar de novo, mas ainda sem conseguir emitir som algum.
Assim foi até que a professora ouviu e percorreu a sala com os olhos, a fim de encontrar o aluno canoro, que em vez de fazer sua lição, entregava-se ao prazer e ao disparate de atrapalhar a concentração de todos.
E é claro que ela encontrou logo o autor de tamanha façanha musical, ou melhor, o suposto autor. Eu sentava na segunda carteira, ela me viu então com o bico a postos, dedicado por demais ao deleite de assoviar. Quer dizer, ela me viu assim e ouviu o som, sem perceber o involuntário ventriloquismo da situação.
Contrariada com tamanha audácia, pelo menos ela pensava isso, levantou-se de sua mesa armada com a sua famigerada régua de madeira de trinta centímetros, que era grossa, e aproximou-se de mim sem que eu a percebesse, ali supostamente assoviando alegremente e, também supostamente, pouco me importando com a sua presença e com os meus afazeres de classe.
Furiosa, deu-me com a dita régua na cabeça, mas não de lado e sim de quina, o que, além de me assustar, doeu demais. Com a dor e o susto eu, ali provido de meu eficiente aparelho sibilante, em vez de gritar, distraído que estava, soltei enfim o meu primeiro e sonoro assovio: FIFIFIIIIIIFIUUUUUUUUUUU...