Cor da pele?
A sala de espera do consultório pediátrico parece mais um mini-parque de diversões.Enquanto minha filha fica com as bochechas vermelhinhas de tanto pular na piscina de bolinhas multicoloridas, apanho uma revista qualquer para matar o tempo.O sol de primavera brilha forte lá fora e não há nenhum sinal de nuvem no céu azul cor de anil.
Na página doze, o título da matéria me chama a atenção: “Cor da pele”. Diz que, para o verão que se aproxima, os tons bege, gelo, cáqui, pérola e pastel serão a tendência.Trocando em miúdos: a "cor da pele" está na moda.
O texto da revista apresenta ainda o termo “nude”, que em inglês, significa nu, despido, sem roupa, descoberto, liso. O tom nude nada mais é do que a expressão “cor da pele” repaginada.
Agora me eu pergunto: a “cor da pele" é da cor da pele de quem? Minha é que não é!Eu não pareceria estar nua se usasse um vestido da cor do que a modelo está usando, mas ela sim, o parece.
Se "cor da pele" é sinônimo de bege, minha tez, que é negra, está fora de moda? Ridículo!
Algumas pessoas que se consideram "cor da pele", referem-se aos negros como os "de cor".Penso que estes indivíduos estão perdidos no arco-íris que eles mesmos criaram.Conheço esta história de cor e salteado, pois já senti isto na pele.Literalmente.
Há alguns anos, um amigo ao se despedir de mim, disse:
- O papo está bom, mas preciso ir, porque amanhã, segunda-feira, é dia de branco!
Eu ri. Mas ri amarelo. Disse-lhe que o dia seguinte era dia de branco, de preto, de vermelho e de amarelo trabalharem, porque atualmente, poucos podem se dar ao luxo de ficar em casa, preguiçando, independente da cor que tenham.
Ele ficou um pouco envergonhado e disse que nunca havia parado para prestar atenção no significado dessa frase tão carregada de preconceitos.
Pois é. A questão é justamente esta. O preconceito está tão arraigado em nossa cultura, que achamos normal a criança de pré-escola pedir o lápis “cor da pele” para desenhar , que o curativo (band-aid), a meia-calça, e o dilatador nasal tragam na embalagem essa nomeclatura descabida.
O médico chama pela minha filha e deixo de lado minhas divagações para prestar atenção na consulta dela.
Como diz o rapaz da novela das sete, fiquei “rosa-chiclete”* com o que li.
(Maria Fernandes Shu – 07 de novembro de 2009)
*ficar rosa-chiclete: indignar-se com algo.