Cabelo Meu, Há Algo mais Feio que Tu e Eu?
 

            Confesso, a bem da verdade, que tenho meus cabelos ¨ondulados¨. Não são ainda ¨um de cada lado¨, mas caminham para tanto. Tenho toda uma história de vida na relação com os mesmos. Rebeldes, desde a infância, não se portavam como eu queria que ficassem. Invejava os meus amigos com aqueles fabulosos cabelos lisos, nascidos para não precisar de pente, ¨shampoo¨ ou de escova, de acordo com minha limitada concepção. Ficava inconformado quando declaravam:
            - Cara, o que eu mais queria era um cabelo com ¨ondinhas¨, como o seu. – Descobri que o ser humano é um perpétuo insatisfeito consigo mesmo, e talvez seja algo que nos mantenha vivos.
            ¨Ondinhas¨ era um jeito manso de dizer que meu cabelo fazia curvas, e muitas, e que não obedeciam a uma fórmula de perfeição que, a juízo, somente deveria existir na minha cabeça. E os atores do cinema pelos quais as mulheres derretiam? Como faziam para manter sempre o ¨topete¨ em prumo? À medida que ganhei maturidade descobri que aquilo era uma ilusão, mas já era tarde, o estrago no meu estado psíquico já se fizera. Meu cabelo era um dos itens que me afastava de um falso ideal de beleza que eu acreditava que deveria ter para que as pessoas gostassem de mim. Complicado? Sim, e muito, para você ver como eu era.
            Na adolescência, que pareceu perdurar mil anos, tal a gama de sofrimentos reais e imaginários que me assomavam, dei para implicar de vez com a minha juba. Tentei mil façanhas. Aproveitando a ¨Onda Black¨ dos anos 70-80, estimulado por um tio que era o ¨terror da minas¨, um verdadeiro ¨Don Juan¨ que segundo contavam as línguas que o cercavam, e que nos cercam a todos, vivia à cata de um rabo de saia, dei para tentar, de vez, encaracolar os meus cabelos.
            - Tu vai ver o que vai aparecer de mulher! Vai arrasar!
            E realmente arrasei a minha auto-estima. Ele me ensinou a pentear, ou a desarrumar as madeixas dando-lhes aspecto de ninho de passarinho. O primeiro passo era pegar um garfo e abrir-lhe os dentes afastando-os. Minha mãe ficou louca com isso! Depois, com os fios molhados, deveria enrolá-los do pior modo possível. Ao secar, estaria com o visual do ¨Toni Tornado¨. Quem disse que eu queria ser ¨Toni Tornado¨? Os ¨Jackson´s Five¨ arrebentavam (tenho quase a mesma idade do Michael) e a cultura de valorizar o natural começava a decolar, mesmo assim o que me fez tentar aquilo foi a idéia de ¨descolar¨ um visual de primeira. Executei a manobra. Fiquei horas no banheiro:
- Você morreu?! – Batiam na porta perguntado.
- Usa o banheiro de fora! – Quando eu respondia assim, podiam desistir. Olhei-me no espelho de um lado a outro, fiz inúmeras poses e achei melhor voltar ao método antigo, ou seja, deixar a rebeldia ajeitar-se por si.
            Meu tio ficou decepcionado por não ganhar um discípulo e eu feliz por que descobri o quanto as coisas poderiam piorar. A partir daí, fui amadurecendo e à medida que ganhava neurônios, a importância da cobertura diminuiu exponencialmente. Aprendi que o charme pessoal conta com um bom penteado, mas que não depende somente dele (Graças a Deus!).