Mulher, o Eixo Central da Mundança

A cada movimento torácico da ofegante respiração inquietava-me como o ar entrava ileso por minhas narinas, mergulhava em meu corpo, inundava meus pulmões, acendia todo um emaranhado de células e, rapidamente, sucumbia ao infinito em forma de gás.

Ora, nada ou pouco posso pensar sobre toda essa misteriosa complexidade existencial, pois minha mente daí esvoaça do meu cérebro e viaja por entre as loucuras do inexplicável, e torno-me um louco.

Quando deitei minhas costas naquele colchonete inconfortável, ao som de um revoar de pássaros e incensos, deleitei-me ao encontro do meu inconsciente, das forças escuras e desconhecidas, enquanto uma loira esquisita me fazia fugir do eixo com palavras de voz mansa e doce. Essas psicólogas. São mais ou tão doidas quanto nós, problemáticos normais descontentes, com sorrisos amarelos, vestidos em mantas negras, atrás de máscaras hipócritas, máscaras importantes para a sobrevivência nessa nossa sociedade poluída e insana. Então a partir de poucos gestos meus analisa-me como se me conhecesse. E pior, algumas vezes acerta em cheio em pontos cruciais, mas por vezes erra. Me irrita esse tom de donos da verdade.

É noite, o barulho dos carros lá fora me assusta, parece que vão invadir meu recinto e capturar meu cérebro, retirar meus neurônios e vende-los a preço de banana. Por favor, deixem-me pensar em paz, sob o silêncio exato da madrugada no ressonar dos amantes.

Ainda respiro e percebo movimentos do meu corpo, começo a senti-lo. Como pode passarmos vivendo nossas medíocres vidas e não perceber nosso corpo, sem olhar para nossas mãos, sem sentir nossas costas e nossas nádegas num assento, sem sentir nossas mãos em bolsos. Sentimos apenas dor. Então vamos correndo a um médico ainda mais problemático e somatizamos nossos sentimentos. Tudo torna-se dor. Vivemos mergulhados na era da dor, da depressão, dos temores. Deve ser essa nossa vida tão competitiva, tão corrida.

Os fluxos mudaram, as mulheres passaram nós, pobres homens, para trás. Hoje elas tomam conta de tudo. Trabalham, buscam filhos na escola, cozinham, cuidam da casa e o pior, nos traem. Essas super-mulheres ainda tem tempo de conquistar amantes de plantão. Todo homem é amante de plantão, então as mulheres se fartam dessa necessidade ofegante que os homens tem por sexo, dessa fome por prazer, por poder. Meros otários, nós. Então as mulheres infartam. Então elas fumam, elas bebem e também morrem. A disputa por espaço tornou a mulher no comando do stress. Elas se apaixonam e choram e amam. E fazem tudo e mais um pouco. E nós, sedentários, ainda assistimos futebol tomando cerveja, perdendo nossos fios de cabelos e acumulando gorduras em nosso abdomem. Fomos passados para trás.

Ainda respiro, por mais que em poucas vezes no dia. Não tenho tempo. Não bebo água e não tenho saco para respirações prolongadas, tão necessárias. Aquelas respirações abdominais em que consigo perceber toda a cinemática do ar, da entrada à saída, mesmo sem entender. Há coisas que não adianta, não consigo entender.

Protesto. Fui passado para trás.