É grave, doutor?
Disseram-me que sou muito exagerada. Exagerada, eu? Tem certeza?
Um escritor no médico:
eu:- Diga-me doutor, qual o meu mal?
dr:- O que você sente?
eu:- Eu sinto uma angústia viceral,
uma ansiedade que inquieta a mente.
dr:- Estou me referindo a o que te trouxe aqui.
eu:- Ah, sim, perdão. Eu me confundi.
Há tempos não durmo direito
Eu me viro e reviro em meu leito
Idéias que não dormem
Em minha mente me consomem
É algo que toma conta de mim
Não me deixa sossegar por fim
Até que sua volúpia de transparecer
Eu resolva atender
Doer... pelo menos não sinto dor
Diga-me: é grave, doutor?
Ofereceu-me um copo d'água:
dr:- Primeiro acalme-se. Você está tendo um ataque nesse exato instante.
eu:- Desculpe. Como pôde ver, não consigo evitar. Mas o doutor sabe o que eu tenho?
O médico fez que sim e me olhou com expressão grave:
dr:- Infelizmente você tem o que chamamos de Síndrome do escritor.
eu:- Mas como? Quando eu posso ter pego isso? Quando começou esse rebuliço?
dr:- Não se pega, você nasceu com isso. Sorte sua que começou a desenvolver os sintomas só agora, alguns começam na adolescência, até mesmo na infância já apresentam sintomas.
eu:- E tem cura?
dr:- Infelizmente, não.
Em seguida acrescentou, em tom confidencial:
dr:- Mas tem como amenizar.
eu:- Como?
dr:- Tampe os olhos e os ouvidos; feche a boca e cruze os braços. Não entre em contato com o mundo externo, que é o que atrai essas "bactérias infernais".
eu:- Mas e as que já estão aqui dentro?
dr:- Não se preocupe, só a necessidade de exteriorizá-la que faz com que elas te incomodem. Se você esquecer o mundo, garanto que isso vai parar. Pelo menos até você voltar a ter contato com o exterior.
eu:- E se não der certo?
dr:- Aí, meu filho, faça um rebuliço também; entre na dança, finja que tem o domínio das palavras. Brinque com elas, para que elas acreditem nisso. Deixe-as confusas, exaustas. Inverta a ordem da frase, altere o significado, troque as palavras de lugar, trace versos, redija estrofes, subordine as orações; desestruture, inove, rime, lance desafios à forma! Gaste o vocabulário! Balance as estruturas gramaticais!
eu:- Mas doutor... isso é o que faço normalmente. Tem certeza de que isso vai me ajudar a parar?
dr:- Parar? Quem disse em parar? Caro poeta, a melhor forma de lidar com essa síndrome é admitindo que é impossível freiar a poesia!
Ok, depois dessa admito que às vezes me excedo...